Especial Trilhas da BNCC | Pensamento investigativo em todas as áreas do conhecimento

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Despertar a curiosidade e desenvolver o olhar crítico e questionador sobre os diversos fenômenos da vida.

“Diego não conhecia o mar. O pai, Santiago Kovadloff, levou-o para que descobrisse o mar. Viajaram para o Sul. Ele, o mar, estava do outro lado das dunas altas, esperando. Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas de areia, depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos. E foi tanta a imensidão do mar, e tanto seu fulgor, que o menino ficou mudo de beleza. E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando, pediu ao pai: — Me ajuda a olhar!”

Eduardo Galeano,

O livro dos abraços, 1989. 

Em uma época de muitas mudanças e incertezas, em que temos de lidar com os resultados e os produtos da evolução tecnológica, torna-se essencial a educação para aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos, aprender a ser, como propõe o relatório Quatro pilares da educação para o século XXI da Unesco, de 1999 (Delors, 2000). Com base nesses quatros pilares, acredito ser possível “ajudar a olhar”. 

Nossos alunos têm acesso a uma quantidade enorme de informações, mas nem sempre sabem o que fazer com elas, pois não aprenderam a “olhar”! Essas informações precisam ser dotadas de significados, de modo que os alunos possam associá-las e gerar o conhecimento a ser utilizado no cotidiano e na compreensão do mundo. Mas o que é pensamento investigativo? Como é possível ensinar a pensar?

Por muitos anos, o ensino de Ciências trabalhou mais com a transmissão do que com a produção do conhecimento, e em muitas escolas essa prática ainda persiste. Pesquisas em diversas áreas da educação e da neurociência, contudo, têm demonstrado que o estudante aprende mais ao se envolver com uma situação-problema e buscar soluções e significados para ela. 

Para tanto, o aluno precisa pensar investigativamente, desenvolvendo competências e habilidades como observar, problematizar, formular questões e hipóteses, verificar, mensurar, constatar, concluir, errar e tentar novamente. 

A prática do pensamento investigativo pode e deve ser utilizada em todas as áreas do conhecimento, não apenas nas ciências da natureza. 

Segundo o filósofo norte-americano Matthew Lipman, na obra A Filosofia vai à escola, o ensino tradicional, em que os conhecimentos são transmitidos do professor para o estudante, constitui o “paradigma-padrão”, ao passo que o ensino que trabalha com o pensamento investigativo configura o “paradigma reflexivo”. Lipman propõe que as disciplinas sejam organizadas de maneira que se complementem, fazendo com que a educação não se limite a promover a memorização das informações transmitidas e objetive “a percepção das relações contidas nos temas investigados”. A adoção do paradigma reflexivo permite investigar e problematizar os conteúdos de cada disciplina, construindo uma reflexão conjunta.  

Ao trabalhar com a proposição da solução de um problema, promove-se um enfrentamento entre os estudantes por meio do diálogo. Nesse paradigma, o importante não é o resultado final, a conclusão, e sim as descobertas feitas ao longo do processo de investigação.  O diálogo promove a reflexão e o pensamento criativo.  

Embora apresente muitas variantes, na técnica mais usual, o professor propõe um problema, que os alunos identificam e trabalham em grupos, sempre partindo de seus conhecimentos prévios. Os itens do problema são levantados, debatidos e registrados. Com base nesse registro, os alunos se organizam para investigar os itens principais em grupo ou individualmente. Em todas as etapas, o professor orienta, ajuda a organizar, faz a intermediação das discussões e propõe fontes de consulta. Todo o resultado das investigações é debatido pelos integrantes do grupo, que, juntos, aprendem a relacionar fatos e informações. 

Nesse processo, o estudante deixa de memorizar e passa a pensar, a questionar, a testar. Com o trabalho em grupo, ele aprende a respeitar as diferenças de opinião, o ritmo de trabalho e as descobertas de cada um, aprende a conviver, a colaborar com o outro. Aprende onde procurar informações e como conectá-las para encontrar respostas. A autonomia intelectual dos estudantes é valorizada.  

O professor deixa o papel de mero transmissor de informações para exercer o papel de organizador, de mediador e sistematizador dos dados que os estudantes encontraram. Com a metodologia de resolução de problemas, o professor trabalha os “quatro pilares da educação para o século XXI”, em vários momentos e de formas variadas. 

Pautada nesses pilares, a educação passa a constituir o principal instrumento para “olhar” o mundo! 

Rita Helena Bröckelmann

é bióloga e editora executiva do Editorial de Biologia e Química da Editora Moderna. 

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Observatório do Professor reúne mais de 3 mil horas de entrevistas para retratar as alegrias e dores de educadores dentro e fora das salas de aula. 

Imagem ilustrativa

Quais fatores podem ser decisivos para transformar a prática docente? A partir de mais de três mil horas de entrevistas, a pesquisa Observatório do Professor, feita pelo Instituto Península em parceria com a PS2P – Observatório de comportamento e cultura, identificou os elementos que interferem na prática do professor que vão além da didática e do domínio do conteúdo.

De acordo com o levantamento, que buscou identificar quem é o professor fora dos muros da escola e quais são as suas angústias e paixões, os professores que conseguiram criar uma ponte de relacionamento com os seus alunos geralmente levam elementos da sua história de vida para as práticas pedagógicas. “Nos melhores exemplos que descobrimos, o professor teve que buscar referências na sua vida pessoal para encontrar caminhos para solucionar problemas que antecedem muito a questão do conteúdo e interferem no processo de aprendizagem”, explica Heloisa Morel, diretora do Instituto Península.

Para entender os professores além dos números e dados, pesquisadores foram a campo para fazer 30 entrevistas em profundidade e fizeram dez vivências presenciais com 60 horas de filmagem, além de reunir informações de 20 diários on-line, com 3 mil horas de acompanhamento remoto do dia a dia de professoras e professores de diferentes regiões do Brasil. A pesquisa também envolveu a observação de seis grupos on-line de profissionais de educação que contam com mais de 1 milhão de membros. 

Com base nessa exploração, a pesquisa identificou seis elementos que interferem na prática do docente:

  • 1 – Identidade: a força das histórias de vida e as experiências pessoais dos professores são determinantes para sua prática. 
  • 2 – Reciprocidade: as experiências educacionais positivas ou negativas podem mudar a relação deles com a educação e a figura de professores-referência podem exercer influência sobre seu desejo de se tornar educador. 
  • 3 – Afeto: o aspecto relacional tem um impacto importante na relação professor-aluno.
  • 4 – Ambiente: é considerado um elemento chave na experiência educacional 
  • 5 – Coletividade: a maior parte dos professores não se sente parte de um projeto maior de escola.
  • 6 – Reputação: os professores e especialistas entrevistados ressaltam que a escola pública é envolta por um conjunto de simbolismos e preconceitos.

“Talvez a profissão do professor seja uma das mais complexas que o país tem. Ele tem que olhar muitas dimensões, não apenas o técnico”, ressalta a diretora do Instituto Península. Ao ampliar o horizonte para considerar elementos que vão além da didática na aprendizagem, ela menciona que essas soluções reforçam a necessidade de políticas públicas olharem para o desenvolvimento integral dos professores. “Nós não vamos conseguir formar alunos para os desafios do século 21 se os professores ainda não se sentem preparados para isso. De uma forma sistêmica, o desenvolvimento integral do professor não é discutido.”

Apesar da rede brasileira de educação básica contar com mais de dois milhões de educadores, entre outros destaques, a pesquisa também identificou um sentimento comum entre boa parte deles: a solidão. Para muitos professores, há pouco espaço de diálogo e troca de experiência com os colegas. “Seu olhar sobre a educação navega entre o prazer de ensinar e a frustração de não conseguir fazer os alunos aprenderem. Muitos sentem o peso de serem vistos como os únicos responsáveis por transformar a realidade das comunidades em que atuam, sentindo-se expostos e até vulneráveis com o desafio”, destaca o Observatório. 

Além de apresentar os principais destaques da pesquisa, o Observatório do Professor reúne textos e vídeos que contam histórias de educadores de diferentes regiões do país que atuam em diferentes contextos. “Com o desenvolvimento integral do docente, o domínio dos conteúdos e uma comunidade escolar fortalecida, é possível lidar com desafios dos alunos, conectar-se a eles e garantir ambientes de aprendizagem, construindo a ponte que liga ao conhecimento e influenciando positivamente todo o sistema educacional”, conclui o Observatório a partir de descobertas e reflexões da pesquisa.

 

Texto: Portal Porvir

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Minha escola, minhas escolhas

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Na voz dos alunos, conheça os desafios da escola para reduzir o hiato entre o que se ensina e o que eles consideram fundamental para a vida adulta.

O que se aprende na escola, de fato, prepara os alunos para o que vem depois dela? Embora a questão seja velha conhecida da comunidade escolar, ela recobra fôlego na reta final rumo ao Novo Ensino Médio. Em teoria, a partir de sua implementação, o hiato entre as expectativas dos jovens e o que lhes é oferecido tende a diminuir. “Os currículos do Ensino Médio deverão considerar a formação integral do aluno, de maneira que adote um trabalho voltado para a construção de seu projeto de vida e para sua formação nos aspectos físicos, cognitivos e socioemocionais”, assegura a MP 746/2016, que inseriu o artigo 36 no parágrafo 5o da LDB (Lei de Diretrizes e Bases). Na prática, fica a dúvida: o que os estudantes consideram essencial para o seu desenvolvimento e construção do projeto de vida? A Educatrix fez a pergunta para duas alunas do Ensino Médio.

De Jacundá (Pará), a 60 km de Marabá, Eilany da Silva, 15 anos, revela que sonha em cruzar as estradas da região — empoeiradas e danificadas pelo vaivém dos caminhões de minério — para morar no exterior. Antes, quer fazer faculdade no Brasil. A carreira ainda não está definida. De acordo com a aluna da 2a série do Ensino Médio na E.E.E.M. Maria da Glória Rodrigues Paixão, da rede pública paraense, o ideal seria ter psicólogos dentro da escola para apoiar os estudantes tanto na resolução de conflitos quanto na hora de fazer boas escolhas.

A mais de 4.200 quilômetros de distância, Luiza Murta Barbosa, 17 anos, faz o último ano do Ensino Médio no Colégio Stockler, na rede privada da capital paulista. É a filha caçula de uma família de engenheiros civis. Até o ano passado, ela achava que as Exatas também eram o seu destino. Tudo mudou quando, em 2019, se deparou com um professor que a incentivou a abrir o leque de possibilidades. O ponto de partida foi o desenvolvimento de novas competências e habilidades em Comunicação. 

Ainda que as duas jovens não se conheçam e vivam realidades bem diferentes, suas histórias ganham contornos semelhantes quando se trata da construção dos projetos de vida. Dúvidas, pressões por todos os lados e expectativas de sucesso são compartilhadas por ambas. No processo de descoberta de si e busca de oportunidades que transcendam os muros da escola, as duas atribuem aos professores um papel decisivo. Cabe a eles, por exemplo, fomentar o intercâmbio de saberes, a formação de repertório e até mesmo os sonhos e a realização deles. 

Ainda que as duas jovens não se conheçam e vivam realidades bem diferentes, suas histórias ganham contornos semelhantes quando se trata da construção dos projetos de vida. Dúvidas, pressões por todos os lados e expectativas de sucesso são compartilhadas por ambas. No processo de descoberta de si e busca de oportunidades que transcendam os muros da escola, as duas atribuem aos professores um papel decisivo. Cabe a eles, por exemplo, fomentar o intercâmbio de saberes, a formação de repertório e até mesmo os sonhos e a realização deles.

A seguir, confira os relatos de Eilany e Luiza, cujas vozes direcionam nossas atenções para os protagonistas desta história: os estudantes. 

 

A escola sob perspectiva do aluno 

A terceira edição da pesquisa Nossa Escola em (Re)Construção, promovida pelo Porvir e Rede Conhecimento Social, ouviu 258.680 estudantes de 11 a 21 anos por meio de uma plataforma de escuta on-line e gratuita. De acordo com os participantes, a escola ideal deve visar à preparação para a vida adulta. Se o foco fosse prepará-los para o mercado de trabalho, 36% dizem que seriam mais felizes. Outros 30% afirmam que aprenderiam mais. Já se o alvo fosse o Enem, 39% garantem que aprenderiam mais, e 32%, que seriam mais felizes. 

Os estudantes esperam encontrar na instituição de ensino um espaço propício para descobrir suas vocações e sonhos, bem como receber orientações para fazer boas escolhas. Não é à toa que 4 em cada 10 jovens afirmam que gostariam de contar com o apoio de um orientador vocacional na escola, seja para ajudá-los a definir a profissão que irão seguir ou a graduação que cursarão. Para 27%, as orientações poderiam ocorrer durante as aulas regulares. Outros 19% preferem aulas especialmente dedicadas ao tema na grade semanal, e 12%, atendimentos individuais de mentoria.  

Em relação aos professores, a maioria dos estudantes demonstra admiração e confiança. Por outro lado, 6 em cada 10 dizem que os colegas não respeitam ou não valorizam os docentes. O relacionamento que se estabelece é considerado regular ou ruim por 50% dos jovens.

Outra demanda que apresentam é por profissionais aptos a apoiá-los em seu desenvolvimento socioemocional e pessoal. Além da figura do professor, 60% dos alunos gostariam de ter psicólogos na escola. Isso não quer dizer que os jovens não zelem por sua independência e protagonismo na vida estudantil. Poder escolher parte das disciplinas que irão cursar é uma medida bem-vinda para 4 a cada 10 alunos. Ter a liberdade de escolher a totalidade delas, no entanto, só faria 20% dos estudantes mais felizes.

 

Luiza Murta Barbosa, 17 

“À primeira vista, pode parecer estranho estudar em um colégio pequeno como o Stockler, com poucos espaços para circular. Mas, na prática, é confortável. Lembra uma cidade do interior, onde todos se cumprimentam, se conhecem e se ajudam.”  

“As turmas têm de 25 a 30 alunos, o que contribui para criar um clima mais intimista nas aulas. Muitos professores fazem projetos interdisciplinares e adotam recursos como vídeos e experiências em laboratório para deixar a teoria menos maçante.”

“Até o ano passado, não tinha a mínima ideia da faculdade que queria fazer ou da profissão que iria trilhar. Se já é difícil escolher uma roupa, quem dirá tomar decisões que mudarão o meu futuro. “

“Mas se tinha uma coisa que eu sabia (ou achava que sabia) é que pertencia às Exatas. Minhas notas eram altas e, na família, tenho vários engenheiros. Por outro lado, sempre fui aberta às oportunidades. Não por acaso, participo da maioria das atividades extracurriculares que a escola oferece.”

“O divisor de águas que me fez descobrir a paixão pela Comunicação (especificamente pela Publicidade e Propaganda) foi uma oficina de teatro em que o professor Celso Solha propôs a montagem da peça O Capeta de Caruaru.”

“Na obra, eu interpretava os gêmeos Chico e Antônio Cipriano: dois personagens masculinos, nordestinos, com características totalmente diferentes entre si e contextos ainda mais diversos. Uma missão nada fácil e que me fez entender quão essencial é ter liberdade de expressão, habilidades de comunicação e ser competente para transmitir a mensagem ao público.”

“Dessa forma, entendi que a vida é um palco e que os sonhos podem ser alcançados mediante esforço, tempo e dedicação.”

“Confesso que fiquei assustada e com medo de apostar em algo que nunca tinha sido o meu forte. Mas contei com o apoio dos projetos de autoconhecimento proporcionados pela escola e o incentivo para transformar uma mera paixão em diferenciais competitivos.”

“Entre eles, destacam-se meu repertório e entendimento de questões sociais, políticas, econômicas e de cidadania – frutos das aulas de Atualidade e das ações intencionais do colégio para dar voz aos estudantes. Hoje entendo essas iniciativas como parte de uma estratégia para formar cidadãos mais conscientes, ativos e preparados para questionar e buscar melhorias no mundo.”

“Essa, porém, não é a realidade pelo Brasil afora. A maioria das escolas já cristalizou seu papel de preparar os jovens para uma prova final de cinco horas de duração e sem nenhuma condição de avaliar a capacidade de alguém. Isso ocorre porque, em geral, o ensino se baseia em conteúdos extremamente específicos e sem conexão com a faculdade que eles querem fazer.”

“Não restam dúvidas de que a maioria dos conteúdos é essencial para construir um conhecimento acadêmico de base. Mas, com o avançar das séries, a escola deveria incentivar o aluno a ir além das disciplinas básicas e perseguir a especialização na sua jornada de aprendizado. Isso nos aproximaria do campo do conhecimento em questão e ainda nos prepararia melhor para o mundo do trabalho.”

“Pensando em um futuro próximo, o mais adequado seriam escolas cujos objetivos transcendessem a futura vida universitária e focassem no presente, com mais preparo para enfrentar o mundo e a vida em sociedade. Os projetos socioemocionais deveriam ganhar mais espaço no currículo.”

“Outro aspecto imprescindível é o olhar atento para a figura do professor. Por mais fácil que seja ter acesso aos conteúdos on-line, o verdadeiro aprendizado se dá na interação com ele.” 

Aluna da 3ª série do Ensino Médio do Colégio Stockler, em São Paulo (SP).

 

Eilany almeida da silva, 15

“Ainda não me sinto preparada para enfrentar o mundo lá fora, ser independente e ter mais responsabilidades. Mas meu sonho é morar em Toronto, no Canadá. Por isso, desde já, faço aulas de inglês na empresa onde trabalho.”

“Antes de partir, quero fazer faculdade no Brasil. Só não estou certa de qual área escolher. Pensei em Medicina, mas tenho medo de sangue. Pensei em Direito, mas já tem muita gente na área. Cheguei a pensar em História porque gosto de estudar religiões. Mas o que me encanta mesmo é a Veterinária, apesar do medo que sinto de alguns animais.”

“Ingressei na E.E.E.M. Maria da Glória Rodrigues Paixão no ano passado, quando fiz a transição para o Ensino Médio. O espaço é grande, com uma quadra esportiva, 12 salas de aula e turmas que variam de 35 a 40 alunos.”

“A grade curricular contempla sete horas/aula por dia. É bastante, mas sinto falta de mais debates e diálogos nas aulas. Os professores preferem não fazer porque esse tipo de dinâmica sempre acaba em confusão – não há respeito à opinião do outro.”

“Na prática, o Ensino Médio é bem diferente do que eu imaginava. Tem muita pressão psicológica, e vejo que isso afeta muito os alunos. Bom mesmo seria não ter provas e, no lugar delas, ter atividades e projetos avaliativos para compor a nota final.”

“Seria importante também contar com psicólogos aos quais pudéssemos recorrer quando necessário. A maioria dos alunos tem problemas psicológicos, e muitos são causados no próprio contexto escolar.”

“Mesmo não sendo perfeita, a escola exerce grande influência sobre mim. Graças a alguns professores e projetos, me tornei uma pessoa melhor e mais compreensiva. Estou aprendendo a respeitar as opiniões dos demais e a perder o medo e o nervosismo de falar em público.”

“Entre os professores que me inspiram, está a Elsamar Emerique, de Arte. Recentemente, ela ganhou um prêmio nacional de arte-educação pelo projeto “Cores do Açaí”, com o qual nos desafiou a pintar telas, usando o açaí como matéria-prima para a confecção de tintas. A experimentação, a investigação e o trabalho em equipe foram algumas das competências que desenvolvi com essa iniciativa.”

“Para o futuro, gostaria que a escola tivesse mais projetos desse tipo, com aulas práticas e espaço para os alunos se expressarem, sem medo de ser julgados. Cada professor poderia elaborar o projeto de acordo com a sua matéria e intercambiar conhecimento com as demais, com a possibilidade inclusive de levar os alunos para apresentar os resultados em outros colégios.”

“Adoraria também que algumas aulas pudessem ocorrer ao ar livre e que as de Matemática e Física incluíssem jogos didáticos que nos ajudassem a aprender e gostar do conteúdo. Muita gente ainda acha essas matérias chatas, um bicho de sete cabeças.”

“Mas, acima de tudo, desejaria que os professores interagissem mais com os estudantes, se colocando à disposição para nos ajudar com qualquer dúvida e sem tanta pressão psicológica.” 

Aluna da 2ª série do Ensino Médio na E.E.E.M. Maria da Glória Rodrigues Paixão, Jacundá (PA).

Texto: Lara Silbiger

 

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A sala de aula como contação de histórias

A sala de aula como contação de histórias

“Mar de Histórias” é a expressão usada em sânscrito (Kathâsaritsâgara) para se referir ao universo das narrativas. Ao transitar por rotas imaginárias, lembre-se da metáfora do mar: é preciso ter um caminho e manter um leme firme, mas é essencial saber que as águas podem ser muito tranquilas, mas também se transformar em verdadeiros maremotos. Esta é a aventura literária da qual fazem parte o mestre e seus alunos: é preciso coragem para trafegar por mundos imaginários, porém, as viagens serão sempre cheias de descobertas. 

Ilustração: Ricardo Davino

A capacidade de imaginar, de pensar simbolicamente e comunicar nossos pensamentos é uma característica exclusiva da nossa espécie. Os seres humanos contam histórias desde sempre; é uma forma ancestral de partilhar conhecimentos às novas gerações. Por isso, a força que uma boa história exerce sobre nós é inegável. 

Volta e meia temos lembranças saudosas das histórias que ouvimos na infância, seja em casa ou na escola, assim como guardamos carinhosamente na memória como foi a primeira leitura literária, ou nos vemos diante de uma enorme dificuldade para interromper um bom livro, cuja narrativa nos prende de uma forma muito envolvente. 

O contar histórias, ou storytelling em inglês, historicamente, sustentou-se de maneira fundamental como uma arte lúdica e um poderoso instrumento de formação da identidade cultural e socioafetiva dos sujeitos. Além de oferecer entretenimento, a contação de histórias nos permite conhecer, imaginar e refletir sobre a vida e as relações e, dessa forma, construir uma visão de mundo.

Um povo que escuta, conta e reconta as mesmas histórias possui valores e visões semelhantes, já que tais elementos são frutos da acumulação de fatos que determinada nação tem como verdade. Daí a importância que uma boa história possui para criar em nós uma sensação de pertencimento ao grupo e de identificação com o coletivo. Essa junção de histórias, valores e visões de mundo geram o “nós”, que não existe sem o “eu” e o “outro”. 

A contação de histórias é fonte de comunicação, apropriação e disseminação de conhecimentos, bem como um veículo de registro dos seres humanos no mundo. É na criação e na contação de histórias, derivadas de registros orais e escritos, que nós, humanidade, encontramos um dos mais eficientes modos de difundir nossos pensamentos e de imprimir nossas marcas. 

 

O termo storytelling 

Se a contação de histórias é originalmente uma antiga arte humana de troca de experiências, realizada por diferentes povos, em diferentes tempos e espaços, por que o termo em inglês storytelling soa relativamente novo?

Embora para muitas pessoas o conceito de storytelling pareça novo, o hábito milenar ganhou espaço como ferramenta estratégica no mundo dos negócios, sobretudo na década de 1990. Nesse período, a publicidade e a comunicação precisavam inovar para causar impacto: numa era altamente tecnológica, tornou-se essencial incorporar às estratégias de marketing elementos que gerassem empatia e maior conexão com as pessoas, além de dar mais destaque às marcas. É assim que o storytelling passa a preencher vazios de ferramentas desgastadas para reter a atenção do público e dá novos contornos à comunicação. 

Na década de 1990, o storytelling passa a ser amplamente estudado nos Estados Unidos como estratégia de comunicação. À época, os fundadores do Center for Digital Storytelling desenvolveram um processo único de treinamento e artes digitais, com forte colaboração da multimídia teatral, conhecido como o Digital Storytelling Workshop. (LAMBERT, 2020) 

Desde então, houve também a fundação do Storycenter, que estuda e dissemina as metodologias que ajudam na construção de uma boa história. Assim, o termo Digital Storytelling ganha mais espaço com a prática sendo apresentada a empresas e instituições, em âmbito mundial. 

O hábito de contar histórias por meio de pinturas, ao redor da fogueira ou numa roda de histórias na escola permanece, mas a intenção da sua criação, a capacidade de informá-las e distribuí-las mudou significativamente com a sua publicização nas mídias sociais como produto. 

O que nos interessa aqui é que o storytelling é uma estratégia rica em elementos da narrativa cuja estrutura é muito viva para a nossa sociedade e, portanto, diante do atual cenário educacional, sua apropriação na esfera pedagógica torna-se indispensável. 

 

De Aristóteles a Campbell: para além do “era uma vez” 

Contar uma história não é algo banal, assim como não é qualquer pessoa que cria uma história ou faz uma contação de forma eficaz. As narrativas pautadas no storytelling seguem uma estrutura específica de apresentação dos fatos. É possível criar histórias a partir de diferentes temas, reais ou fictícios, desde que arranjados na ordem correta e que, com eles, se saiba fazer uma boa costura. 

O storytelling como o conhecemos está pautado nas seis partes constitutivas da tragédia aristotélica: enredo (mythos), caracteres (ethe), elocução (lexis), pensamento (dianoia), espetáculo (opsis) e música (melopoiia), encontrados no livro Poética (aristóteles, [1965] 2008, p. 13), em que se apresentam as primeiras teorizações sobre narrativas. Veja a seguir:

Além dos elementos citados, a ambientação ou o ambiente físico em que as personagens atuarão merece destaque. A narrativa eficaz não ignora o cenário, já que, muitas vezes, ele fortalece as interações entre os personagens, nos conta sobre motivações e comportamentos, bem como caracteriza oportunidades ou obstáculos presentes na trama.

Assim como na estrutura narrativa aristotélica, os elementos de uma história são facilmente reconhecidos tanto na tradição oral, quanto no romance moderno ou no cinema. Como são intrínsecos a nossa cultura, é algo que cativa. Por isso, é praticamente impossível nos depararmos com estudos de storytelling que não tenham base em Aristóteles. 

No mundo contemporâneo, os roteiros de storytelling estão pautados no conceito da Jornada do Herói ou Monomito, de Joseph Campbell. O antropólogo, por meio de amplos estudos de mitos e lendas, encontrou um padrão repetido nas narrativas de diferentes povos. Esses estudos foram publicados no livro O herói de mil faces, amplamente popular por volta da década de 1980.

A seguir, temos uma síntese das doze etapas da jornada do herói de Campbell, que sustentam aquilo que o autor chamou de mito único ou monomito:

Segundo Campbell, o caminho comum da aventura mitológica é representado pela sequência: partida > iniciação > retorno. O herói começa sua aventura de mundo cotidiano em direção a uma região de maravilhas sobrenaturais, enfrenta forças fabulosas e consegue uma conquista decisiva. Ao final, ele retorna de sua emblemática aventura com uma força descomunal, com a capacidade de ofertar a seus irmãos diferentes mimos, sonhos, esperanças e materialidades. 

Em 1998, Christopher Vogler, então roteirista da Disney, redigiu um memorando intitulado Um guia prático para o herói de mil faces, como base para a construção de um método de estrutura narrativa. Nele, o autor descreve “[…] o conjunto de conceitos conhecido como “Jornada do Herói”, extraídos da psicologia profunda de Carl G. Jung e dos estudos míticos de Joseph Campbell”. 

O guia, conhecido como a Jornada do Escritor, tenta relacionar as ideias dos autores às narrativas modernas e expõe doze etapas em que facilmente observamos os elementos das estruturas vistas anteriormente: 

Apesar de ter escrito um guia, Vogler sempre fez questão de destacar que se trata de uma forma, não uma fórmula. Portanto, partimos do princípio de que as histórias têm forma, têm fórmula e intencionalidade; têm começo, meio e fim e, até mesmo essa clássica tríade, a depender do autor, pode variar.

 

Como reconhecer as etapas do storytelling numa obra

Até aqui, pudemos conhecer a constituição conceitual, histórica e metodológica do storytelling. Para facilitar a compreensão da estrutura narrativa, mostramos esquemas com uma facilitação visual que aborda o que vimos de forma prática. 

Um exercício muito proveitoso, que nos ajuda na apropriação dos conceitos, é analisar determinada obra e enquadrá-la numa lógica narrativa. A seguir, fizemos uma análise básica do filme Pantera Negra, dividindo-o nos três atos previstos por Vogler (2006). 

Que tal você escolher uma obra de sua preferência e fazer esse exercício? Você pode usar quaisquer dos esquemas apresentados ou ampliar suas pesquisas sobre as jornadas e visualizar a narrativa dentro das etapas. Depois disso, sua vida nunca mais será a mesma! 

 

O potencial educativo do storytelling: O professor como storyteller

Se você é professor, já é um contador de histórias! Ser professor envolve, mesmo que indiretamente, atuação e dramaticidade, assim como um planejamento pedagógico que tem um conteúdo a ser narrado, com começo, meio e fim. Portanto, o Storytelling está presente nas salas de aulas, mesmo fora dos momentos de contação de histórias.

Quando nós, professores, priorizamos aulas que engajam as pessoas, as convidamos a se envolverem de diferentes formas, seja na contação da fábula A cigarra e a formiga, seja numa aula sobre o impacto do CO2 na atmosfera ou a forma como se aplica a fórmula de Bhaskara na vida real. Numa “aula contada”, chamamos os envolvidos a contribuírem com perguntas e respostas, fazerem sugestões, acrescentarem ideias, tudo para que compreendam e se apropriem dos conceitos apresentados e construam novos conhecimentos. 

Desenvolvemos aulas com um conjunto de técnicas características da estrutura das narrativas. Para tanto, trazemos ilustrações, elaboramos um cenário — mesmo que apenas narrado —, alternamos o tom e intensidade da nossa fala, andamos pela sala, gesticulamos, fazemos caras e bocas, e interagimos com os alunos, esperando deles atenção e encantamento. Não raro, as aulas ministradas com esse foco viralizam, tornam-se inesquecíveis, tal como as mais conhecidas histórias! Envolver os estudantes por meio do storytelling acrescenta valor ao trabalho pedagógico, que se torna dialógico, criativo e humanizado. Com ele, é possível: 

► ampliar os espaços para rodas de conversas e interações;

► auxiliar o estudante a dar sentido e a buscar novas leituras;

► incentivar o aluno a fazer releituras e criar suas próprias histórias;

► estimular o exercício espontâneo da escrita;

► desenvolver a escuta ativa;

► despertar o desejo de interpretar textos e dramatizar ideias;

► incentivar a expressão e comunicação oral;

► desenvolver um trabalho de qualidade, com resultados positivos, independentemente do nível de escolaridade. 

Utilize o storytelling como uma prática educomunicativa para comunicar soluções, ideias e proposições. Ao colocar os estudantes diante de uma situação-problema, eles podem esboçar uma ideia, registrá-la, construir uma personagem para contar a história, mostrando, dentro de uma estrutura narrativa, a saga do herói na implementação da solução que encontraram. Para isso, precisam se perguntar: de que forma vamos comunicar a ideia? Com quais instrumentos? Quem é quem nessa produção? Que jornada é essa? 

Obviamente, dada a diversidade do universo narrativo, não há uma fórmula absoluta para o desenvolvimento da arte de contar histórias. No entanto, como vimos, há um padrão que pode ser seguido, cujas etapas devem ser adaptadas, tornando factível a possibilidade de criação de uma história única.

A contação de histórias, portanto, é uma estratégia pedagógica diferenciada e, uma vez em sintonia com a realidade da turma, suas necessidades e expectativas de aprendizagem, suas temáticas de interesse e, principalmente, suas potencialidades, otimiza o processo educativo de maneira lúdica e emancipatória. 

Já que ensino e aprendizagem caminham juntos, a contação de histórias exerce um papel fundamental no desenvolvimento intelectual e de humanização de educador e educando. Ao despertar o interesse pela leitura e escuta de textos, ao contar um conteúdo e ao provocar os estudantes a criarem suas narrativas, a imaginação é acionada, favorecendo o desenvolvimento da comunicação e de interação entre narrador e espectador. Como consequência, surge uma interação sociocultural que, por vezes, resulta no intenso e imediato interesse de ouvir e recontar histórias para o mundo a fim de preservá-lo e transformá-lo. 

 

PARA SABER MAIS 

  • ARISTÓTELES. Poética [1965]. Lisboa: Edição da Fundação Calouste Gulbenkian, 2008. 
  • CAMPBELL, J. O herói de mil faces. Tradução de Adail Ubirajara Sobral. São Paulo: Pensamento/Cultrix, 1989. 
  • CAMPBELL, J. Os primeiros contadores de histórias. História e antropologia, 2005, v. 6 fev.-jul. 2015. Disponível em: mod.lk/0VtkK. Acesso em: 9 jul. 2020. 
  • LAMBERT, J.; HESSLER, B. Digital storytelling: story work for urgent times. 6. ed. Berkeley: Paperback, 2020.
  • PIETRO, H. Quer ouvir uma história? Lendas e mitos no mundo da criança. São Paulo: Angra, 1999.
  • VOGLER, C. A jornada do escritor: estruturas míticas para escritores [1998]. Tradução de Ana Maria Machado. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006.

Julci Rocha 

é fundadora e diretora da Redesenho Educacional. Mestre em Educação: Currículo pela PUC/SP, pós-graduada em gestão educacional, design educacional e educação inovadora. Licenciada em Letras pela USP. Integra o time de docentes da pós-graduação e extensão do Instituto Singularidades. Tem experiência em gestão de programas inovadores em redes públicas e privadas, com experiência em instituições importantes como Instituto Paulo Freire e Fundação Lemann. Atua na formação inicial e continuada há 10 anos, com destaque para as metodologias ativas e cultura digital.

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A formação do aluno começa sempre com o desenvolvimento do professor. Pensando nisso, criamos as Formações Educatrix,…
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A necessidade de resgatarmos na Educação a comunidade aprendente
Lidar com o cenário da pandemia principalmente na Educação tem sido desafiador ao mesmo tempo que nos apresenta maneiras diferentes de possibilitar novos caminhos a Educação.
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Diálogo: escola-família
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A importância dos jogos na educação emergencial
Os jogos sempre tiveram um lugar especial na educação

Expedição 2030: o desafio certo de educar para um futuro incerto.

Expedição 2030: o desafio certo de educar para um futuro incerto.

Para qual mundo estamos formando nossas crianças e adolescentes? Quais serão as habilidades e competências exigidas para uma vida bem-sucedida?

Adivinhos e futurólogos nunca tiveram tamanha dificuldade para prever ou compreender o que o destino nos reserva. Diante da velocidade e profundidade das transformações que marcam este início de século XXI, não há nada mais certo em relação ao futuro do que a sua própria incerteza.

As mudanças climáticas transformam o planeta. As novas tecnologias redefinem a vida humana. Os processos migratórios e as mudanças de comportamento provocam choques culturais. A busca de competitividade modifica as relações econômicas e gera novos contextos políticos e sociais. E todas essas movimentações juntas aprofundam os níveis de insegurança e ansiedade dos indivíduos, que têm dificuldade de caminhar por terreno tão movediço e ameaçador.

No mundo atual, poucas são as garantias e muitos os desafios que nos afetam individual, local e globalmente, demandando novas capacidades, soluções e regulações. Simultaneamente, crescem as dúvidas e expectativas em relação à educação e seu poder de não apenas preparar as novas gerações para enfrentar uma realidade futura bastante nebulosa, mas também de capacitá-las para reduzir os impactos negativos e ampliar os benefícios trazidos por todas essas mudanças.

Conhecimentos tradicionais continuam sendo importantes, mas não se mostram suficientes para assegurar que as pessoas se realizem no âmbito pessoal, social e profissional, muito menos para que interajam com as questões próprias da contemporaneidade e participem da construção de um mundo melhor para si e para os demais. Cientes desse desafio, especialistas e organizações ao redor do globo apontam para a necessidade de revermos o que se ensina e se aprende nas escolas.

Como consequência, diversos países promovem reformas curriculares com o intuito de aproximar a educação do seu projeto de nação, de maneira que crianças e jovens sejam preparados para se orientar e se realizar em um mundo em constante mudança, bem como contribuir para o alcance de objetivos nacionais e globais de médio e longo prazo.

No Brasil, essa oportunidade surge com a construção da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e com a Reforma do Ensino Médio, que reabrem a discussão sobre o que todos os estudantes brasileiros precisam aprender. O propósito, nesse caso, para além de resolver problemas recorrentes relacionados à equidade e qualidade da Educação Básica, também se constitui em oportunidade para oferecer aos alunos brasileiros as aprendizagens que eles precisam para enfrentar os desafios da vida contemporânea, muitos dos quais ainda nem conhecemos. 

 

Desafio profissional

As tecnologias modificam cotidianamente os fazeres e ambientes de trabalho, dos mais simples aos mais complexos. Tarefas repetitivas passam a ser realizadas por máquinas, enquanto os profissionais se diferenciam por suas habilidades humanas. Criam-se novas profissões, muitas se transformam e outras deixam de existir. Em grande medida, formamos estudantes para desempenhar funções que ainda nem existem.
Diante dessa nova realidade, cabe às escolas desenvolver a capacidade dos indivíduos de continuar aprendendo ao longo da vida, para que adquiram novos conhecimentos conforme se fizerem necessários. Para tanto, é importante motivar os alunos a valorizar e buscar o conhecimento de forma cada vez mais autônoma, acessando as mais diversas fontes, bem como selecionando, contextualizando e aplicando as informações que obtêm. Os estudantes também precisam ser estimulados a pensar sobre a sua própria aprendizagem, para serem capazes de identificar o que precisam aprender e como aprendem melhor.
O domínio das tecnologias é outro requisito indispensável para que os alunos estejam preparados para um mundo do trabalho cada vez mais automatizado. Ainda que o seu diferencial seja justamente realizar o que não pode ser delegado às máquinas, o profissional do futuro precisa saber utilizá-las com inteligência e habilidade. O não desenvolvimento dessa competência desde a idade escolar compromete significativamente as chances dos indivíduos de se inserirem e progredirem profissionalmente. Portanto, torna-se vital assegurar que todas as escolas ofereçam essa oportunidade aos seus alunos. 
A rápida obsolescência de conhecimentos técnicos demanda ainda que os currículos das instituições de ensino contemplem competências mais transversais, que os apoiem a desempenhar qualquer profissão contemporânea, mesmo as que ainda não foram inventadas. Atributos como flexibilidade, criatividade, trabalho em equipe, resolução de problemas, inovação e empreendedorismo estão entre elas. Uma vez imbuídos dessas capacidades, as novas gerações terão mais facilidade de se adaptar às mudanças e de se inserir com mais dignidade, qualidade e sustentabilidade em um mundo do trabalho em constante mutação.
 
“O domínio das tecnologias é outro requisito indispensável para que os alunos estejam preparados para um mundo do trabalho cada vez mais automatizado.”
 

Realização pessoal  

Vivemos em um contexto de permanente instabilidade, marcado por ambiguidades e imprevisibilidade. A ausência de respostas únicas e a dificuldade de prevermos o que nos acontecerá potencializa o surgimento de tensões emocionais, que afetam crianças, adolescentes e jovens de forma cada vez mais precoce e aguda. Proliferam-se os casos de hiperatividade, apatia, agressividade, depressão, automutilação e suicídio.

Algumas dessas questões requerem tratamento psicológico ou psiquiátrico. No entanto, a escola que se propõe a preparar os estudantes para a vida também tem o papel fundamental de ensiná-los a lidar melhor com suas emoções e relações. Para tanto, os currículos, da Educação Infantil ao Ensino Médio, precisam desenvolver a capacidade dos alunos de conhecer, apreciar e cuidar de si mesmos, bem como de reconhecer, expressar e lidar com seus sentimentos. A proposta é oferecer aprendizagens que os ajudem a superar dificuldades e realizar toda a sua potência, respeitando e acolhendo a sua essência. 

Especialmente em relação aos adolescentes e jovens, é imprescindível que as escolas os estimulem a ter aspirações e a identificar caminhos e metas para alcançar os seus projetos de vida, seja por esforço próprio, seja lutando por seus direitos. As práticas pedagógicas e o ambiente escolar também precisam favorecer o desenvolvimento de competências como determinação – para que perseverem e vençam obstáculos; resiliência – para que saibam lidar com frustrações, insucessos e adversidades sem desistir do seu intento; e autoconfiança – para que acreditem em sua própria capacidade de aprender, progredir e realizar os seus sonhos.

Os avanços na ciência e medicina impactam na longevidade e aprofundam as discussões sobre qualidade de vida, estimulando a mudança de hábitos pessoais. O cuidado consigo mesmo, portanto, também passa pela capacidade dos estudantes de promoverem a sua própria saúde e bem-estar. Cresce a importância dos currículos incluírem aprendizagens que levem ao desenvolvimento físico, à incorporação de atitudes saudáveis e à prevenção de situações de risco. A expectativa é garantir que corpo e mente saudáveis contribuam para que as novas gerações tenham perspectiva, garra e vitalidade para superar as turbulências que encontrarão pela frente. 

 

Choque cultural  

O mundo será cada vez mais urbano e grande parte da população continuará se movendo em direção às grandes metrópoles. Paralelamente, processos migratórios em todo globo já estão mudando a face dos países. Assim como as seleções europeias que disputaram a última Copa do Mundo, nações, comunidades, empresas e até mesmo escolas serão cada vez mais multiculturais. Porém, ao contrário do que acontece no futebol, fora de campo, o aumento da diversidade tende a ampliar os níveis de estranhamento, intolerância e xenofobia. 

Conquistas civis e sociais também continuarão provocando transformações profundas na mentalidade e no comportamento de indivíduos e sociedades, muitas vezes se contrapondo a valores e tradições há muito estabelecidos. Mudanças de percepção e legislação em relação ao papel da mulher, identidade de gênero e orientação sexual, novos arranjos familiares, inclusão de minorias étnicas e raciais, legalização do aborto, descriminalização da maconha, entre tantas outras, seguirão desestabilizando o sistema de crenças e ameaçando os mais conservadores. Como consequência, prevê-se o acirramento dos preconceitos e da violência contra aqueles que, apesar de terem seus direitos garantidos por lei, ainda são percebidos como diferentes.

Vale lembrar que esses novos cenários modificam o próprio ambiente escolar, onde conflitos dessa natureza se intensificam. Diante dessa realidade, as instituições de ensino não têm como se eximir de abordar essas questões com seus alunos, muitos dos quais são vítimas cotidianas do preconceito e da exclusão. 

Faz-se necessário, portanto, educar as novas gerações para valorizar e conviver com a diversidade. Dessa forma, além de aprender a transitar por contextos culturalmente diversos com competência, respeito e apreciação, também se conscientizarão da importância de atuar como mediadores culturais, construindo pontes entre os diferentes e minimizando os impactos negativos gerados pelas mudanças em curso. 

 

Transformação social  

Ao contrário do que se imaginava, o aumento da riqueza produzida no mundo não foi capaz de acabar com a pobreza, nem reduzir as desigualdades. A bem da verdade, pesquisas demonstram que a distância entre ricos e pobres está aumentando, tanto em relação às pessoas, quanto aos países. Crescem também os níveis de violência que têm como origem as injustiças sociais. 

A reversão dessas tendências depende em grande medida da forma como educamos as nossas crianças e jovens. Currículos conectados com os principais desafios da humanidade se preocupam em desenvolver competências como empatia, diálogo e colaboração, imprescindíveis para que as novas gerações tenham uma atitude mais justa, inclusiva e solidária em relação aos demais.

Torna-se fundamental desenvolver nos estudantes a capacidade de pensar criticamente sobre as questões sociais locais e globais, perceber-se como agente de transformação e criar soluções para os desafios que se apresentam. A realização de pesquisas e projetos de intervenção sobre a realidade tem grande poder de sensibilizar, ampliar a compreensão e engajar os alunos em iniciativas voltadas a melhorar a vida de populações e comunidades vulneráveis, inclusive se fizerem parte delas. 

Importante ressaltar que se a educação não for capaz de fortalecer a coesão e a justiça social, colocaremos cada vez mais em risco a possibilidade de convivência entre os desiguais. 

 

Preservação ambiental  

O planeta também está se transformando de forma rápida e inequívoca, ainda que muitos tentem relativizar os efeitos das mudanças climáticas. O crescimento populacional e o impacto da vida humana na Terra exaurem recursos naturais, comprometem a qualidade de elementos vitais, como a água e o ar, e nos colocam o desafio de repensar a intensidade das nossas pegadas, sob pena de comprometermos a nossa própria existência.

Os prognósticos nessa área são críticos, mas não de todo irreversíveis. Ainda temos como utilizar a nossa inteligência e disposição para modificar a maneira como nos relacionamos com o meio ambiente. A mudança, no entanto, precisa começar desde cedo, para garantir a incorporação de atitudes e comportamentos mais sustentáveis.

A adoção de práticas associadas ao consumo consciente, à preservação de áreas ecológicas e à redução da emissão de poluentes, entre muitas outras, depende de uma mudança profunda de paradigma. E ainda que as legislações ambientais busquem regular esses processos, grande parte dessas decisões ainda acontecem no nível pessoal. 

Mais uma vez, as escolas têm papel preponderante na formação de crianças, adolescentes e jovens para que se conscientizem sobre o impacto de suas ações no planeta, adotem comportamentos ambientalmente responsáveis e sejam defensores e promotores da sustentabilidade. Cultivo de hortas escolares, campanhas de reciclagem de resíduos sólidos e visitas a parques e reservas continuam tendo valor. No entanto, é preciso ampliar a compreensão dos estudantes sobre grandes desafios ambientais, tanto os que fazem parte do nosso cotidiano – como o tempo debaixo do chuveiro -, quanto os dilemas de ordem global – como a escolha de nossas matrizes energéticas. 

 

Participação cidadã  

Em meio a todas essas mudanças, ampliam-se os questionamentos em relação aos sistemas vigentes, que se mostram incapazes de promover desenvolvimento econômico aliado a liberdades civis, direitos humanos, justiça social e preservação ambiental. Surgem novos arranjos, em geral acompanhados por divergências e polarizações, que se amplificam por meio de redes sociais. O cenário aprofunda o clima de instabilidade política e, ao mesmo tempo, potencializa a participação dos cidadãos na construção de novas alternativas.

Já no âmbito da ética, as ambiguidades se avolumam, colocando as normas vigentes em cheque e demandando mudanças importantes no campo da regulamentação. Novas legislações surgirão ou se modificarão para dar conta dos dilemas emergentes, muitos deles relacionados ao uso das tecnologias, especialmente as de informação e comunicação. 

Essas novas circunstâncias demandarão novos papéis e responsabilidades por parte da sociedade civil, cujas formas de participação na vida pública também vêm se modificando velozmente, levando à criação de novos formatos de organização, mobilização, controle social e envolvimento popular na solução de questões de interesse público. A demanda crescente para os próximos anos diz respeito à capacidade dos cidadãos de serem agentes do seu próprio destino e das transformações que aspiram para o seu entorno e para o mundo. 

Vale lembrar que grande parte desse empoderamento cívico e social tem seu início na escola, quando os estudantes dispõem de espaço para discutir e vivenciar a sua cidadania, aprendendo a tomar decisões éticas, a se envolver em processos democráticos e a se corresponsabilizar por desafios coletivos. 

Ainda nesse sentido, é fundamental que os currículos escolares desenvolvam a sua capacidade de compreender e refletir criticamente sobre os modelos políticos e econômicos vigentes, para que possam transitar por eles com propriedade e contribuir para a construção de propostas mais justas, inclusivas, democráticas e sustentáveis.

Em relação às tecnologias, os alunos precisam se conscientizar do impacto que geram na sociedade e aprender a utilizá-las de maneira ética e significativa, inclusive como instrumento de poder e participação. Além disso, devem se atentar para os riscos de manipulação e exposição, especialmente por parte das redes sociais.

Importante destacar que muitas das competências que passam a integrar os currículos escolares ao redor do mundo não são necessariamente novas, mas tornam-se cada vez mais indispensáveis apresentadas no século XXI. Mais relevante ainda constatar que redefinições em relação ao que os estudantes precisam aprender provocam mudanças diretas no como eles aprenderão. 

Assim sendo, as reformas curriculares devem vir acompanhadas de revisões igualmente profundas sobre práticas pedagógicas, materiais didáticos, ambientes escolares e sistemas de avaliação da aprendizagem. Foco no aluno, personalização, uso de tecnologias e metodologias ativas, aprendizagem mão na massa, mobilidade e flexibilidade de espaços dentro e fora da escola são algumas das tendências que dialogam com essa proposta. 

Uma vez que têm como foco a promoção do desenvolvimento dos estudantes em todas as suas dimensões (intelectual, social, emocional, física e cultural), os currículos contemporâneos também precisam ser compreendidos como um desafio que não se restringe às unidades escolares. Sua implementação demanda o esforço conjunto de diversos atores, incluindo-se as famílias, as comunidades do entorno, as áreas de saúde, cultura, esporte, tecnologia e desenvolvimento social, entre outras. 

Só assim conseguiremos preparar as novas gerações para se manter no rumo ao navegar por mares de imprevisibilidade e incertezas.

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Adivinhos e futurólogos nunca tiveram tamanha dificuldade para prever ou compreender o que o destino nos reserva. Diante da velocidade e profundidade das transformações que marcam este início de século XXI, não há nada mais certo em relação ao futuro do que a sua própria incerteza.

As mudanças climáticas transformam o planeta. As novas tecnologias redefinem a vida humana. Os processos migratórios e as mudanças de comportamento provocam choques culturais. A busca de competitividade modifica as relações econômicas e gera novos contextos políticos e sociais. E todas essas movimentações juntas aprofundam os níveis de insegurança e ansiedade dos indivíduos, que têm dificuldade de caminhar por terreno tão movediço e ameaçador.

No mundo atual, poucas são as garantias e muitos os desafios que nos afetam individual, local e globalmente, demandando novas capacidades, soluções e regulações. Simultaneamente, crescem as dúvidas e expectativas em relação à educação e seu poder de não apenas preparar as novas gerações para enfrentar uma realidade futura bastante nebulosa, mas também de capacitá-las para reduzir os impactos negativos e ampliar os benefícios trazidos por todas essas mudanças.

Conhecimentos tradicionais continuam sendo importantes, mas não se mostram suficientes para assegurar que as pessoas se realizem no âmbito pessoal, social e profissional, muito menos para que interajam com as questões próprias da contemporaneidade e participem da construção de um mundo melhor para si e para os demais. Cientes desse desafio, especialistas e organizações ao redor do globo apontam para a necessidade de revermos o que se ensina e se aprende nas escolas.

Como consequência, diversos países promovem reformas curriculares com o intuito de aproximar a educação do seu projeto de nação, de maneira que crianças e jovens sejam preparados para se orientar e se realizar em um mundo em constante mudança, bem como contribuir para o alcance de objetivos nacionais e globais de médio e longo prazo.

No Brasil, essa oportunidade surge com a construção da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e com a Reforma do Ensino Médio, que reabrem a discussão sobre o que todos os estudantes brasileiros precisam aprender. O propósito, nesse caso, para além de resolver problemas recorrentes relacionados à equidade e qualidade da Educação Básica, também se constitui em oportunidade para oferecer aos alunos brasileiros as aprendizagens que eles precisam para enfrentar os desafios da vida contemporânea, muitos dos quais ainda nem conhecemos. 

 

Desafio profissional

As tecnologias modificam cotidianamente os fazeres e ambientes de trabalho, dos mais simples aos mais complexos. Tarefas repetitivas passam a ser realizadas por máquinas, enquanto os profissionais se diferenciam por suas habilidades humanas. Criam-se novas profissões, muitas se transformam e outras deixam de existir. Em grande medida, formamos estudantes para desempenhar funções que ainda nem existem.
Diante dessa nova realidade, cabe às escolas desenvolver a capacidade dos indivíduos de continuar aprendendo ao longo da vida, para que adquiram novos conhecimentos conforme se fizerem necessários. Para tanto, é importante motivar os alunos a valorizar e buscar o conhecimento de forma cada vez mais autônoma, acessando as mais diversas fontes, bem como selecionando, contextualizando e aplicando as informações que obtêm. Os estudantes também precisam ser estimulados a pensar sobre a sua própria aprendizagem, para serem capazes de identificar o que precisam aprender e como aprendem melhor.
O domínio das tecnologias é outro requisito indispensável para que os alunos estejam preparados para um mundo do trabalho cada vez mais automatizado. Ainda que o seu diferencial seja justamente realizar o que não pode ser delegado às máquinas, o profissional do futuro precisa saber utilizá-las com inteligência e habilidade. O não desenvolvimento dessa competência desde a idade escolar compromete significativamente as chances dos indivíduos de se inserirem e progredirem profissionalmente. Portanto, torna-se vital assegurar que todas as escolas ofereçam essa oportunidade aos seus alunos. 
A rápida obsolescência de conhecimentos técnicos demanda ainda que os currículos das instituições de ensino contemplem competências mais transversais, que os apoiem a desempenhar qualquer profissão contemporânea, mesmo as que ainda não foram inventadas. Atributos como flexibilidade, criatividade, trabalho em equipe, resolução de problemas, inovação e empreendedorismo estão entre elas. Uma vez imbuídos dessas capacidades, as novas gerações terão mais facilidade de se adaptar às mudanças e de se inserir com mais dignidade, qualidade e sustentabilidade em um mundo do trabalho em constante mutação.
 
“O domínio das tecnologias é outro requisito indispensável para que os alunos estejam preparados para um mundo do trabalho cada vez mais automatizado.”
 

Realização pessoal  

Vivemos em um contexto de permanente instabilidade, marcado por ambiguidades e imprevisibilidade. A ausência de respostas únicas e a dificuldade de prevermos o que nos acontecerá potencializa o surgimento de tensões emocionais, que afetam crianças, adolescentes e jovens de forma cada vez mais precoce e aguda. Proliferam-se os casos de hiperatividade, apatia, agressividade, depressão, automutilação e suicídio.

Algumas dessas questões requerem tratamento psicológico ou psiquiátrico. No entanto, a escola que se propõe a preparar os estudantes para a vida também tem o papel fundamental de ensiná-los a lidar melhor com suas emoções e relações. Para tanto, os currículos, da Educação Infantil ao Ensino Médio, precisam desenvolver a capacidade dos alunos de conhecer, apreciar e cuidar de si mesmos, bem como de reconhecer, expressar e lidar com seus sentimentos. A proposta é oferecer aprendizagens que os ajudem a superar dificuldades e realizar toda a sua potência, respeitando e acolhendo a sua essência. 

Especialmente em relação aos adolescentes e jovens, é imprescindível que as escolas os estimulem a ter aspirações e a identificar caminhos e metas para alcançar os seus projetos de vida, seja por esforço próprio, seja lutando por seus direitos. As práticas pedagógicas e o ambiente escolar também precisam favorecer o desenvolvimento de competências como determinação – para que perseverem e vençam obstáculos; resiliência – para que saibam lidar com frustrações, insucessos e adversidades sem desistir do seu intento; e autoconfiança – para que acreditem em sua própria capacidade de aprender, progredir e realizar os seus sonhos.

Os avanços na ciência e medicina impactam na longevidade e aprofundam as discussões sobre qualidade de vida, estimulando a mudança de hábitos pessoais. O cuidado consigo mesmo, portanto, também passa pela capacidade dos estudantes de promoverem a sua própria saúde e bem-estar. Cresce a importância dos currículos incluírem aprendizagens que levem ao desenvolvimento físico, à incorporação de atitudes saudáveis e à prevenção de situações de risco. A expectativa é garantir que corpo e mente saudáveis contribuam para que as novas gerações tenham perspectiva, garra e vitalidade para superar as turbulências que encontrarão pela frente. 

 

Choque cultural  

O mundo será cada vez mais urbano e grande parte da população continuará se movendo em direção às grandes metrópoles. Paralelamente, processos migratórios em todo globo já estão mudando a face dos países. Assim como as seleções europeias que disputaram a última Copa do Mundo, nações, comunidades, empresas e até mesmo escolas serão cada vez mais multiculturais. Porém, ao contrário do que acontece no futebol, fora de campo, o aumento da diversidade tende a ampliar os níveis de estranhamento, intolerância e xenofobia. 

Conquistas civis e sociais também continuarão provocando transformações profundas na mentalidade e no comportamento de indivíduos e sociedades, muitas vezes se contrapondo a valores e tradições há muito estabelecidos. Mudanças de percepção e legislação em relação ao papel da mulher, identidade de gênero e orientação sexual, novos arranjos familiares, inclusão de minorias étnicas e raciais, legalização do aborto, descriminalização da maconha, entre tantas outras, seguirão desestabilizando o sistema de crenças e ameaçando os mais conservadores. Como consequência, prevê-se o acirramento dos preconceitos e da violência contra aqueles que, apesar de terem seus direitos garantidos por lei, ainda são percebidos como diferentes.

Vale lembrar que esses novos cenários modificam o próprio ambiente escolar, onde conflitos dessa natureza se intensificam. Diante dessa realidade, as instituições de ensino não têm como se eximir de abordar essas questões com seus alunos, muitos dos quais são vítimas cotidianas do preconceito e da exclusão. 

Faz-se necessário, portanto, educar as novas gerações para valorizar e conviver com a diversidade. Dessa forma, além de aprender a transitar por contextos culturalmente diversos com competência, respeito e apreciação, também se conscientizarão da importância de atuar como mediadores culturais, construindo pontes entre os diferentes e minimizando os impactos negativos gerados pelas mudanças em curso. 

 

Transformação social  

Ao contrário do que se imaginava, o aumento da riqueza produzida no mundo não foi capaz de acabar com a pobreza, nem reduzir as desigualdades. A bem da verdade, pesquisas demonstram que a distância entre ricos e pobres está aumentando, tanto em relação às pessoas, quanto aos países. Crescem também os níveis de violência que têm como origem as injustiças sociais. 

A reversão dessas tendências depende em grande medida da forma como educamos as nossas crianças e jovens. Currículos conectados com os principais desafios da humanidade se preocupam em desenvolver competências como empatia, diálogo e colaboração, imprescindíveis para que as novas gerações tenham uma atitude mais justa, inclusiva e solidária em relação aos demais.

Torna-se fundamental desenvolver nos estudantes a capacidade de pensar criticamente sobre as questões sociais locais e globais, perceber-se como agente de transformação e criar soluções para os desafios que se apresentam. A realização de pesquisas e projetos de intervenção sobre a realidade tem grande poder de sensibilizar, ampliar a compreensão e engajar os alunos em iniciativas voltadas a melhorar a vida de populações e comunidades vulneráveis, inclusive se fizerem parte delas. 

Importante ressaltar que se a educação não for capaz de fortalecer a coesão e a justiça social, colocaremos cada vez mais em risco a possibilidade de convivência entre os desiguais. 

 

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O planeta também está se transformando de forma rápida e inequívoca, ainda que muitos tentem relativizar os efeitos das mudanças climáticas. O crescimento populacional e o impacto da vida humana na Terra exaurem recursos naturais, comprometem a qualidade de elementos vitais, como a água e o ar, e nos colocam o desafio de repensar a intensidade das nossas pegadas, sob pena de comprometermos a nossa própria existência.

Os prognósticos nessa área são críticos, mas não de todo irreversíveis. Ainda temos como utilizar a nossa inteligência e disposição para modificar a maneira como nos relacionamos com o meio ambiente. A mudança, no entanto, precisa começar desde cedo, para garantir a incorporação de atitudes e comportamentos mais sustentáveis.

A adoção de práticas associadas ao consumo consciente, à preservação de áreas ecológicas e à redução da emissão de poluentes, entre muitas outras, depende de uma mudança profunda de paradigma. E ainda que as legislações ambientais busquem regular esses processos, grande parte dessas decisões ainda acontecem no nível pessoal. 

Mais uma vez, as escolas têm papel preponderante na formação de crianças, adolescentes e jovens para que se conscientizem sobre o impacto de suas ações no planeta, adotem comportamentos ambientalmente responsáveis e sejam defensores e promotores da sustentabilidade. Cultivo de hortas escolares, campanhas de reciclagem de resíduos sólidos e visitas a parques e reservas continuam tendo valor. No entanto, é preciso ampliar a compreensão dos estudantes sobre grandes desafios ambientais, tanto os que fazem parte do nosso cotidiano – como o tempo debaixo do chuveiro -, quanto os dilemas de ordem global – como a escolha de nossas matrizes energéticas. 

 

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Em meio a todas essas mudanças, ampliam-se os questionamentos em relação aos sistemas vigentes, que se mostram incapazes de promover desenvolvimento econômico aliado a liberdades civis, direitos humanos, justiça social e preservação ambiental. Surgem novos arranjos, em geral acompanhados por divergências e polarizações, que se amplificam por meio de redes sociais. O cenário aprofunda o clima de instabilidade política e, ao mesmo tempo, potencializa a participação dos cidadãos na construção de novas alternativas.

Já no âmbito da ética, as ambiguidades se avolumam, colocando as normas vigentes em cheque e demandando mudanças importantes no campo da regulamentação. Novas legislações surgirão ou se modificarão para dar conta dos dilemas emergentes, muitos deles relacionados ao uso das tecnologias, especialmente as de informação e comunicação. 

Essas novas circunstâncias demandarão novos papéis e responsabilidades por parte da sociedade civil, cujas formas de participação na vida pública também vêm se modificando velozmente, levando à criação de novos formatos de organização, mobilização, controle social e envolvimento popular na solução de questões de interesse público. A demanda crescente para os próximos anos diz respeito à capacidade dos cidadãos de serem agentes do seu próprio destino e das transformações que aspiram para o seu entorno e para o mundo. 

Vale lembrar que grande parte desse empoderamento cívico e social tem seu início na escola, quando os estudantes dispõem de espaço para discutir e vivenciar a sua cidadania, aprendendo a tomar decisões éticas, a se envolver em processos democráticos e a se corresponsabilizar por desafios coletivos. 

Ainda nesse sentido, é fundamental que os currículos escolares desenvolvam a sua capacidade de compreender e refletir criticamente sobre os modelos políticos e econômicos vigentes, para que possam transitar por eles com propriedade e contribuir para a construção de propostas mais justas, inclusivas, democráticas e sustentáveis.

Em relação às tecnologias, os alunos precisam se conscientizar do impacto que geram na sociedade e aprender a utilizá-las de maneira ética e significativa, inclusive como instrumento de poder e participação. Além disso, devem se atentar para os riscos de manipulação e exposição, especialmente por parte das redes sociais.

Importante destacar que muitas das competências que passam a integrar os currículos escolares ao redor do mundo não são necessariamente novas, mas tornam-se cada vez mais indispensáveis apresentadas no século XXI. Mais relevante ainda constatar que redefinições em relação ao que os estudantes precisam aprender provocam mudanças diretas no como eles aprenderão. 

Assim sendo, as reformas curriculares devem vir acompanhadas de revisões igualmente profundas sobre práticas pedagógicas, materiais didáticos, ambientes escolares e sistemas de avaliação da aprendizagem. Foco no aluno, personalização, uso de tecnologias e metodologias ativas, aprendizagem mão na massa, mobilidade e flexibilidade de espaços dentro e fora da escola são algumas das tendências que dialogam com essa proposta. 

Uma vez que têm como foco a promoção do desenvolvimento dos estudantes em todas as suas dimensões (intelectual, social, emocional, física e cultural), os currículos contemporâneos também precisam ser compreendidos como um desafio que não se restringe às unidades escolares. Sua implementação demanda o esforço conjunto de diversos atores, incluindo-se as famílias, as comunidades do entorno, as áreas de saúde, cultura, esporte, tecnologia e desenvolvimento social, entre outras. 

Só assim conseguiremos preparar as novas gerações para se manter no rumo ao navegar por mares de imprevisibilidade e incertezas.

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Tecnologias Ativas

Tecnologias Ativas

Plataformas e tutoriais para quem está começando – ou não! 

 
 

EDUCAÇÃO NO SÉCULO 21

Como escolas e educadores no mundo todo estão repensando suas práticas, procurando inovar e aproximar suas salas de aula da sociedade contemporânea? Esta publicação discute a educação dentro do contexto brasileiro e traz iniciativas e projetos desenvolvidos no Brasil pelo Google for Education para inspirar as instituições de ensino que querem transformar suas práticas pedagógicas, a partir da formação de seus alunos e professores. SAIBA MAIS Livro digital gratuito disponível em http://mod.lk/smart

 HANGOUTS MEET 

 
A plataforma de compartilhamento do Google permite videochamadas com até 250 participantes e está com todos os recursos avançados disponíveis gratuitamente até 1o de julho de 2020. ACESSE EM http://mod.lk/faveduc
 

POPPLET 

 
 
A ideia é formar um mapa mental de determinado tema, sendo possível criar remota e coletivamente uma apresentação dinâmica sobre qualquer assunto. O aplicativo é também usado para construir “tempestade de ideias” em grupos. ACESSE EM https://popplet.com/
 

ONENOTE  

Ferramenta de produção e compartilhamento de conteúdos desenvolvida pela Microsoft, o OneNote permite criar lições interativas, com orientações em áudio e texto, e inserção de comentários do professor sobre as lições de casa. ACESSE EM http://mod.lk/favedc2

 

FLIPGRID 

Cada tema é tratado em uma “grade”, que serve como ponto de encontro da turma. Ali, o professor vai agregando reflexões, vídeos, palestras e textos, podendo interagir com os alunos, por áudio ou vídeos curtos. ACESSE EM https://flipgrid.com

 

WEBQUEST

 
Trata-se de uma metodologia de pesquisa que usa os próprios recursos da internet e que vem sendo usada por educadores há mais de uma década. Cria-se um roteiro de aprendizagem sobre determinado tema e os alunos aprendem enquanto o completam. Veja um exemplo a seguir com o tema Biodiversidade. ACESSE EM http://mod.lk/favbio

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A formação do aluno começa sempre com o desenvolvimento do professor. Pensando nisso, criamos as Formações Educatrix,…
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A necessidade de resgatarmos na Educação a comunidade aprendente
Lidar com o cenário da pandemia principalmente na Educação tem sido desafiador ao mesmo tempo que nos apresenta maneiras diferentes de possibilitar novos caminhos a Educação.
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Diálogo: escola-família
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A importância dos jogos na educação emergencial
Os jogos sempre tiveram um lugar especial na educação

Educar cidadãos globais para manter a paz no mundo

Educar cidadãos globais para manter a paz no mundo

A educação é a principal ferramenta para combater um mundo cada vez mais intolerante.

Texto: Fernando M. Reimers | Tradução: Rafael Spigel | Ilustração: Vinícius Matsuei

Em 1925, o professor Isaac Kandel, da Universidade Columbia, discursou para a associação de diretores de escolas do ensino médio e defendeu veementemente a educação para a cidadania global. Ele argumentou que se as escolas norte-americanas não preparassem seus alunos para uma compreensão global, os Estados Unidos não se tornariam um poder para a paz, mas sim um poder para a instabilidade no mundo. Kandel fez tal discurso apenas sete anos após o fim da Primeira Guerra Mundial e 14 anos antes do principal conflito global que estava por vir. Nascido na Romênia e tendo imigrado para os Estados Unidos, ele conhecia a dor e o sofrimento causados pela guerra e sentiu, à época de seu discurso, como a paz é frágil, como o conflito nunca está tão distante e como a paz requer o cultivo de disposições. Outros educadores que sobreviveram às duas guerras tiveram percepções semelhantes sobre a importância da educação para a paz. Em seu famoso discurso sobre Paz e Educação em 1932, Maria Montessori defendeu uma pedagogia que motivasse a criança a fazer escolhas e contestou a educação autoritária, que preparava o aluno para seguir governantes autoritários. Seu discurso foi publicado pelo Bureau Internacional de Educação da Unesco, do qual Jean Piaget era diretor. Anos mais tarde, o próprio Piaget escreveria uma biografia de Jan Amos Comenius, destacando o papel de Comenius na promoção da educação para a paz.

A conscientização da devastação e do sofrimento causados pela Segunda Guerra Mundial levou governos ao redor do mundo a procurarem condições para a paz sustentável, o que se refletiu na criação das Nações Unidas, na adoção da Declaração Universal dos Direitos Humanos e na inclusão da educação como um direito humano. A Declaração tinha como base os valores de liberdade, igualdade e solidariedade global, que foram o alicerce de boa parte do trabalho dos governos e das instituições globais criadas no pós-guerra. E não há um lugar no qual esses valores são melhor refletidos do que no relatório da Unesco sobre Educação para o século XXI, Educação: um tesouro a descobrir. No entanto, tais valores são cada vez mais contestados por movimentos populistas e nacionalistas, com nuances de xenofobia e intolerância.

Os atuais e crescentes desafios da educação para a cidadania global

Uma ideologia populista emergente desafia as aspirações do ensino público, em especial da educação para a cidadania global, bem como o trabalho de instituições que promovem os valores de liberdade, igualdade e solidariedade. Os populistas defendem mais poder para grupos locais definirem as metas da educação e menos ação das instituições governamentais e intergovernamentais. Além disso, contestam a ideia de direitos humanos universais. Se o nacionalismo é a nova força organizadora, a noção de pertencimento e não pertencimento é definida pela cidadania, e não por associação à humanidade, uma contestação à educação para a cidadania global. Tal questionamento aos direitos humanos universais leva à contestação dos direitos das minorias culturais e étnicas, por exemplo, o direito de se enxergarem representadas no currículo. Nos Estados Unidos, indivíduos e grupos pressionam escolas por mudanças no currículo que reduzem a ênfase em tópicos e conteúdos globais. Grupos conservadores discutem há muito tempo sobre o currículo e os livros didáticos nas escolas, e tais conflitos têm aumentado desde a última campanha presidencial, segundo relatos que ouvi de professores e diretores.

O populismo representa um risco ao enfrentamento dos desafios globais. Ao renegar uma ação conjunta para enfrentar desafios globais, como a mudança climática ou os direitos humanos, cria-se um contexto social no qual professores encontrarão cada vez mais dificuldade para lecionar sobre tais temas.

Um estudo do Southern Poverty Law Center, mostra que, além do nacionalismo e do populismo, há um aumento de grupos de ódio e manifestações odiosas em muitas partes do mundo. Nos Estados Unidos, cresceram os casos de intolerância, dentro e fora das escolas e universidades, na forma mais explícita de antissemitismo, supremacia branca, islamofobia e ódio a negros e imigrantes.

Nesse contexto, é imprescindível redobrar nossos esforços para educar os alunos para a cidadania global. A inclusão disso como uma das metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável representa uma oportunidade. O comprometimento da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) para incluir a avaliação da competência global nos estudos do Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes) trará muita da atenção necessária para esse domínio de competência do aluno, assim como os estudos comparativos internacionais sobre educação cívica conduzidos pela IEA (Associação Internacional para a Avaliação da Conquista Educacional).

Para contribuir com esses esforços a favor da educação para a cidadania global, publiquei recentemente três recursos curriculares, desenvolvidos com meus alunos da pós-graduação. O livro Empoderar Crianças e Jovens para a Cidadania Global defende que a educação deve auxiliar o aluno a entender e a promover os direitos humanos e oferece um rigoroso currículo para apoiar a educação para a cidadania global desde a Educação Infantil até o Ensino Médio. O livro Empoderando Alunos Para Melhorar o Mundo: Um Guia Prático explica por que uma ênfase renovada sobre a cidadania global é essencial em face do crescente populismo e ódio. Ele oferece protocolos para ajudar os professores e diretores a desenvolverem estratégias escolares amplas que defendem a educação e o currículo para a cidadania global, alinhados com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável; e um complemento para a Declaração dos Direitos Humanos em que expõe nossas obrigações para alcançar um mundo que seja inclusivo, pacífico e sustentável.

O livro Learning to Collaborate for the Global Common Good é uma análise dos desafios que a democracia enfrenta ao redor do mundo e traz uma série de recursos para promover competências e habilidades para a participação cívica democrática. Os cinco princípios a seguir conduzem as três publicações:

01 – Planejar o currículo com o objetivo em mente

Uma abordagem eficiente para desenvolver o currículo é inicia-lo com os objetivos em mente. Embora a maioria dos planejamentos comece com a orientação em termos de conhecimento ou competências com às quais estão alinhados, eles raramente estendem tal meta a uma visão mais ampla que informe a seleção de tais competências. Como resultado, embora possa haver uma visão implícita de longo prazo que forneça orientação para as competências que conduzem o desenvolvimento do currículo, tal visão não é pública e, portanto, a hipótese central que conduz tal currículo (“se os alunos adquirem essas competências, eles serão capazes de alcançar as seguintes”) não é de conhecimento público e, dessa forma, não é avaliável. Proponho uma abordagem alternativa que torne pública as duas hipóteses-chaves que reforçam qualquer currículo: se envolvermos os alunos em experiências de aprendizagem específicas, eles vão adquirir certas competências; se eles adquirirem tais competências, serão capazes de alcançar resultados específicos a longo prazo, com consequências para eles e para as comunidades das quais fazem parte.

Esses recursos dão ao currículo uma visão pública, não partidária e que tem sido endossada por governos ao redor do mundo. Isso é o mais próximo que conseguimos chegar de um pacto público que reflita a aspiração compartilhada do “bem comum” da humanidade. Os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, incluídos na estrutura adotada por mais de 150 líderes mundiais na Assembleia Geral da ONU em 2015, oferecem uma visão otimista de um mundo que é inclusivo, pacífico e sustentável. Os objetivos conduzem uma série de metas específicas e mensuráveis. Por exemplo, o Objetivo 1 – Erradicação da Pobreza propõe a erradicação das formas mais extremas de pobreza no planeta e traz seis metas específicas:

 

1

Até 2030, reduzir pelo menos à metade a proporção de homens, mulheres e crianças, de todas as idades, que vivem na pobreza, em todas as suas dimensões, de acordo com as definições nacionais.

 

Implementar, em nível nacional, medidas e sistemas de proteção social adequados, para todos, incluindo pisos, e até 2030 atingir a cobertura substancial dos pobres e vulneráveis. 

 

3

Até 2030, garantir que todos os homens e mulheres, particularmente os pobres e vulneráveis, tenham direitos iguais aos recursos econômicos, bem como o acesso a serviços básicos, propriedade e controle sobre a terra e outras formas de propriedade, herança, recursos naturais, novas tecnologias apropriadas e serviços financeiros, incluindo microfinanças.

 

4

Até 2030, construir a resiliência dos pobres e daqueles em situação de vulnerabilidade, e reduzir a exposição e vulnerabilidade destes a eventos extremos relacionados com o clima e outros choques e desastres econômicos, sociais e ambientais.

 

5

Garantir uma mobilização significativa de recursos a partir de uma variedade de fontes, inclusive por meio do reforço da cooperação para o desenvolvimento, para proporcionar meios adequados e previsíveis para que os países em desenvolvimento, em particular os países menos desenvolvidos, implementem programas e políticas para acabar com a pobreza em todas as suas dimensões.

 

6

 

Criar marcos políticos sólidos em níveis nacional, regional e internacional, com base em estratégias de desenvolvimento a favor dos pobres e sensíveis a gênero, para apoiar investimentos acelerados nas ações de erradicação da pobreza.

Alcançar cada uma dessas metas requer ações específicas que, por sua vez, requerem capacidades específicas. Como essas metas globais só podem ser alcançadas se as comunidades locais fizerem a sua parte, elas necessariamente implicam em ações e escolhas feitas por muitas pessoas ao redor do mundo. Proporcionar às pessoas as capacidades para fazer escolhas e tomar atitudes é tarefa da educação.

Ao envolver os educadores na análise de quais competências são necessárias para alcançar as metas, e, por sua vez, discernir quais pedagogias e experiências ajudarão os alunos a adquiri-las, a abordagem que segui fez mais do que começar com o objetivo em mente. Ela proporcionou um nível de transparência e responsabilidade profissional e pública para as escolhas feitas em qualquer planejamento de currículo que raramente estão disponíveis em normas estatais ou com livros didáticos e recursos curriculares.

02 – Ativar redes de melhoria para projetar o currículo

O segundo princípio é que a tarefa de planejar o currículo, especialmente quando envolve domínios inovadores ou complexos, requer a colaboração de colegas. Embora possamos apreciar o ideal de que cada professor seja capaz de desenvolver o seu próprio currículo, na prática, o trabalho de ensinar é estruturado de tal forma que limita consideravelmente a quantidade de tempo dedicada ao planejamento do currículo. Não é surpresa que existem muitos recursos on-line para a ajudar o professor a compartilhar currículos e aulas e que, na prática, muitos docentes recorrem a recursos já existentes.

A razão pela qual os professores já criaram redes informais para compartilhar recursos, ou dependem de recursos existentes, é a complexidade do desenvolvimento curricular de alta qualidade. Tradicionalmente essa tem sido a vantagem das editoras de livros didáticos: a capacidade de envolver diversos editores especialistas, autores e outros profissionais, produzindo materiais de alta qualidade e distribuindo os custos necessários para financiar sua produção pelo grande número de usuários.

No entanto, existem limites para a forma convencional de alcançar economias de escala ao produzir materiais instrucionais, e um deles é que esses recursos devem ter como alvo algum grupo específico, razão pela qual muitos livros didáticos estão alinhados com as normas dos estados onde há mais alunos. Um dos méritos da ideia da Base Nacional Comum Curricular, um conjunto nacional de normas curriculares, é justamente o de capacitar tais economias de escala no desenvolvimento de recursos instrucionais de alta qualidade.

As redes profissionais têm uma nítida vantagem como forma de alavancar a inteligência coletiva. Elas podem se adaptar dinamicamente ao feedback decorrente dos ciclos rápidos da experimentação e podem aumentar o aprendizado decorrente de ciclos similares que ocorrem concomitantemente em diversos cenários. Nesse sentido, as redes profissionais têm um potencial inerente para aprendizagem e adaptação que foge das formas mais convencionais de produzir currículo e livros didáticos.

03 – Aprender fazendo

Os profissionais devem necessariamente experimentar como uma forma de criar novos conhecimentos. De fato, uma rede de desenvolvimento é um amplo laboratório para experimentações contínuas em busca de soluções para desafios complexos.

A epistemologia que reforça esse princípio é que o conhecimento profissional deve se valer da prática, não pode ser gerado na ausência de ou desprovido de prática. Ser professor é uma profissão não apenas porque aqueles que a praticam devem dominar o conhecimento especializado para conduzir seu trabalho, mas também no sentido de que aqueles que a praticam devem contribuir para o desenvolvimento de conhecimento especializado. Para tal conhecimento, baseado na prática, se tornar conhecimento profissional, disponível para outros, ele deve ser público, e não privado. Uma rede profissional é uma forma de fazer que o conhecimento oriundo da prática se submeta à análise essencial para se tornar público. Ademais, a confiança nos princípios de pensamento com base em planejamento e em redes de desenvolvimento proporciona um contexto para a experimentação sistemática e teste de hipóteses que estão implícitas em qualquer currículo.

04 – O poder de uma educação baseada em problemas

Algumas das competências necessárias para prosperar no século XXI são melhor adquiridas ao envolver os alunos em problemas reais e ao convidá-los a testarem soluções. Tal educação, baseada em problemas e projetos como esses, vale-se das tradições da educação progressiva desenvolvida por John Dewey e é consistente com o atual conhecimento sobre como defender um aprendizado mais profundo.

05 – O poder da colaboração em equipes diversas

A realização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável exigirá colaboração sem precedentes em todos os níveis. Se há uma habilidade que todos os alunos precisarão desenvolver é a colaboração. Os recursos apresentados nesses livros sobre metodologias baseadas em projetos ajudam a desenvolver tais habilidades colaborativas. Mas se os professores devem ensinar os alunos a colaborar, eles próprios devem aprender a co- laborar profissionalmente.

A prática da educação global e o movimento da educação global

Ao alinhar o currículo à estrutura dos Objetivos de Desenvolvimento das Nações Unidas, pretende-se cultivar uma mentalidade entre os alunos para educá-los como cidadãos globais.

O projeto de educar todos os alunos é um movimento global que começou com a disseminação do ensino público. Esse movimento de educação global acontecia de duas formas: envolvia colaborações entre a fraternidade de educadores de várias nações e ensinava os alunos a compreender o poder de tais colaborações globais para promoverem as suas próprias, bem como desafios compartilhados.

Não é por acaso que o ensino público expandiu significativamente ao redor do mundo após o direito à educação ser incluído como um dos direitos na Declaração Universal adotada pelas Nações Unidas em 1948. Foi o resultado da solidariedade global e da cooperação mobilizada para promover a paz mundial e da estabilidade que fez o ensino público expandir o seu alcance para incluir metade das crianças do mundo que foram excluídas antes da adoção da Declaração.

De forma semelhante, a expansão do ensino público antes da adoção da Declaração Universal dos Direitos Humanos beneficiou-se também da cooperação e das trocas entre as fronteiras nacionais.

Tais interesses e esforços sempre contestaram (e foram contestados por) visões mais paroquiais da educação. Atualmente, um nacionalismo e isolacionismo intolerante e ressurgente desafia as colaborações globais e a própria aspiração de educar alunos a serem cosmopolitas. Vemos tal ascensão do nacionalismo intolerante, ao qual o ex-vice-presidente norte-americano Joe Biden denominou “populismo falsificado e nacionalismo falso”, como um perigo ao princípio democrático básico, tal como à ideia de igualdade fundamental de todas as pessoas ou à ideia democrática de que os indivíduos devem colaborar com os outros para o bem comum. Esses desafios aos valores democráticos são exatamente a razão para envolver os alunos na educação global.

A educação global é sempre um caminho para desenvolver um conjunto mais amplo de competências necessárias para a participação em um mundo em constante mudança, que alguns denominaram “habilidades do século XXI” ou “aprendizado mais profundo” (Reimers e Chung 2016 e 2018). Como professores buscam novas formas de aprendizagem para preparar os alunos para as exigências do século XXI, descobrir pontos eficazes de entrada para a renovação pedagógica é fundamental. Mudanças são desafiadoras. As noções de que os alunos deveriam se envolver em problemas reais, ou de que eles deveriam fazer isso de forma colaborativa, por exemplo, embora raramente novas, já provaram ser bem difíceis de serem traduzidas para novas abordagens pedagógicas que foram dimensionadas para servir a todos os alunos. A educação global, largamente ausente em muitas escolas, proporciona um conveniente ponto de entrada para a renovação pedagógica, de uma forma que não ameaça diretamente culturas escolares estabelecidas, mas que pode, gradual e fundamental- mente, modernizar a instrução.

Uma nova liderança para o ensino público

As instituições de ensino público estão sob ataque das mesmas forças que atacam a democracia e os direitos humanos. Manter escolas públicas vai exigir a mesma liderança eficaz que a manutenção da democracia exige. Professores e suas organizações têm um importante papel para cumprir ao liderar um movimento amplo em apoio às escolas públicas.

Se for para mobilizar um movimento democrático de apoiadores de forma bem-sucedida, tal liderança deve se concentrar nas necessidades dos estudantes. Ou seja, tal liderança deve estar no centro da prática profissional do educador, e não apenas em questões básicas do dia a dia. Construir essa liderança vai exigir novas abordagens que deverão começar no ensino e no aprendizado. A rede profissional que desenvolvemos é uma forma de construir uma liderança profissional em que os professores se envolvem com o desafio de reinventar o currículo e a pedagogia a fim de servir aos alunos, para prepará-los para um mundo de constantes e rápidas mudanças.

Ao fazer esse trabalho, esses líderes dos professores estão desenvolvendo as habilidades necessárias para a colaboração e para a liderança colaborativa. Como o processo que esses professores seguiram incluía a aproximação de colegas em suas escolas, persuadindo-os a experimentar as novas aulas e recursos, essa experiência desenvolveu a liderança e cultivou habilidades necessárias para exercer influência sem autoridade, apoiando-se em conhecimento profissional e no comprometimento com um processo aberto e sujeito à responsabilidade profissional e pública.

Quase um século depois de Isaac Kandel defender a promoção do entendimento internacional nas escolas norte-americanas, para educar cidadãos globais que poderiam ser emissários da paz, as ameaças crescentes do populismo e da intolerância fazem isso tão necessário hoje em dia quanto era naquela época. Devemos renovar nossos esforços ao avançar na educação dos direitos humanos, na educação para a paz, na educação para a sustentabilidade e no desenvolvimento para a cidadania global, mesmo que esse trabalho se torne ainda mais difícil de fazer e os riscos de fazê-lo se tornem maiores.

Fernando M. Reimers

Especialista na área de políticas educacionais globais e inovação. É professor de Práticas Internacionais de Educação da Fundação Ford, diretor da Global Education Innovation Initiative e do Programa de Políticas de Educação Internacional da Harvard University.

Para saber mais:

  • REIMERS, Fernando M.; CHOPRA, Vidur; CHUNG, Connie K.; HIGDON, Julia; O’DONNEL, E.B. Empoderar Crianças e Jovens para a Cidadania Global. Download em mod.lk/ed15empo
  •  
  • REIMERS, Fernando M. Empoderando alunos para melhorar o mundo: um guia prático. Download em mod.lk/ed15guia
  •  
  • 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. Disponível em mod.lk/17objsus
  •  
  • Educação: um tesouro a descobrir (Unesco, 2010). Disponível em mod.lk/ed15ten1
  •  
  • Southern Poverty Law Center. Hate map. Disponível em mod.lk/hatemap

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Texto: Fernando M. Reimers | Tradução: Rafael Spigel | Ilustração: Vinícius Matsuei

Em 1925, o professor Isaac Kandel, da Universidade Columbia, discursou para a associação de diretores de escolas do ensino médio e defendeu veementemente a educação para a cidadania global. Ele argumentou que se as escolas norte-americanas não preparassem seus alunos para uma compreensão global, os Estados Unidos não se tornariam um poder para a paz, mas sim um poder para a instabilidade no mundo. Kandel fez tal discurso apenas sete anos após o fim da Primeira Guerra Mundial e 14 anos antes do principal conflito global que estava por vir. Nascido na Romênia e tendo imigrado para os Estados Unidos, ele conhecia a dor e o sofrimento causados pela guerra e sentiu, à época de seu discurso, como a paz é frágil, como o conflito nunca está tão distante e como a paz requer o cultivo de disposições. Outros educadores que sobreviveram às duas guerras tiveram percepções semelhantes sobre a importância da educação para a paz. Em seu famoso discurso sobre Paz e Educação em 1932, Maria Montessori defendeu uma pedagogia que motivasse a criança a fazer escolhas e contestou a educação autoritária, que preparava o aluno para seguir governantes autoritários. Seu discurso foi publicado pelo Bureau Internacional de Educação da Unesco, do qual Jean Piaget era diretor. Anos mais tarde, o próprio Piaget escreveria uma biografia de Jan Amos Comenius, destacando o papel de Comenius na promoção da educação para a paz.

A conscientização da devastação e do sofrimento causados pela Segunda Guerra Mundial levou governos ao redor do mundo a procurarem condições para a paz sustentável, o que se refletiu na criação das Nações Unidas, na adoção da Declaração Universal dos Direitos Humanos e na inclusão da educação como um direito humano. A Declaração tinha como base os valores de liberdade, igualdade e solidariedade global, que foram o alicerce de boa parte do trabalho dos governos e das instituições globais criadas no pós-guerra. E não há um lugar no qual esses valores são melhor refletidos do que no relatório da Unesco sobre Educação para o século XXI, Educação: um tesouro a descobrir. No entanto, tais valores são cada vez mais contestados por movimentos populistas e nacionalistas, com nuances de xenofobia e intolerância.

Os atuais e crescentes desafios da educação para a cidadania global

Uma ideologia populista emergente desafia as aspirações do ensino público, em especial da educação para a cidadania global, bem como o trabalho de instituições que promovem os valores de liberdade, igualdade e solidariedade. Os populistas defendem mais poder para grupos locais definirem as metas da educação e menos ação das instituições governamentais e intergovernamentais. Além disso, contestam a ideia de direitos humanos universais. Se o nacionalismo é a nova força organizadora, a noção de pertencimento e não pertencimento é definida pela cidadania, e não por associação à humanidade, uma contestação à educação para a cidadania global. Tal questionamento aos direitos humanos universais leva à contestação dos direitos das minorias culturais e étnicas, por exemplo, o direito de se enxergarem representadas no currículo. Nos Estados Unidos, indivíduos e grupos pressionam escolas por mudanças no currículo que reduzem a ênfase em tópicos e conteúdos globais. Grupos conservadores discutem há muito tempo sobre o currículo e os livros didáticos nas escolas, e tais conflitos têm aumentado desde a última campanha presidencial, segundo relatos que ouvi de professores e diretores.

O populismo representa um risco ao enfrentamento dos desafios globais. Ao renegar uma ação conjunta para enfrentar desafios globais, como a mudança climática ou os direitos humanos, cria-se um contexto social no qual professores encontrarão cada vez mais dificuldade para lecionar sobre tais temas.

Um estudo do Southern Poverty Law Center, mostra que, além do nacionalismo e do populismo, há um aumento de grupos de ódio e manifestações odiosas em muitas partes do mundo. Nos Estados Unidos, cresceram os casos de intolerância, dentro e fora das escolas e universidades, na forma mais explícita de antissemitismo, supremacia branca, islamofobia e ódio a negros e imigrantes.

Nesse contexto, é imprescindível redobrar nossos esforços para educar os alunos para a cidadania global. A inclusão disso como uma das metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável representa uma oportunidade. O comprometimento da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) para incluir a avaliação da competência global nos estudos do Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes) trará muita da atenção necessária para esse domínio de competência do aluno, assim como os estudos comparativos internacionais sobre educação cívica conduzidos pela IEA (Associação Internacional para a Avaliação da Conquista Educacional).

Para contribuir com esses esforços a favor da educação para a cidadania global, publiquei recentemente três recursos curriculares, desenvolvidos com meus alunos da pós-graduação. O livro Empoderar Crianças e Jovens para a Cidadania Global defende que a educação deve auxiliar o aluno a entender e a promover os direitos humanos e oferece um rigoroso currículo para apoiar a educação para a cidadania global desde a Educação Infantil até o Ensino Médio. O livro Empoderando Alunos Para Melhorar o Mundo: Um Guia Prático explica por que uma ênfase renovada sobre a cidadania global é essencial em face do crescente populismo e ódio. Ele oferece protocolos para ajudar os professores e diretores a desenvolverem estratégias escolares amplas que defendem a educação e o currículo para a cidadania global, alinhados com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável; e um complemento para a Declaração dos Direitos Humanos em que expõe nossas obrigações para alcançar um mundo que seja inclusivo, pacífico e sustentável.

O livro Learning to Collaborate for the Global Common Good é uma análise dos desafios que a democracia enfrenta ao redor do mundo e traz uma série de recursos para promover competências e habilidades para a participação cívica democrática. Os cinco princípios a seguir conduzem as três publicações:

01 – Planejar o currículo com o objetivo em mente

Uma abordagem eficiente para desenvolver o currículo é inicia-lo com os objetivos em mente. Embora a maioria dos planejamentos comece com a orientação em termos de conhecimento ou competências com às quais estão alinhados, eles raramente estendem tal meta a uma visão mais ampla que informe a seleção de tais competências. Como resultado, embora possa haver uma visão implícita de longo prazo que forneça orientação para as competências que conduzem o desenvolvimento do currículo, tal visão não é pública e, portanto, a hipótese central que conduz tal currículo (“se os alunos adquirem essas competências, eles serão capazes de alcançar as seguintes”) não é de conhecimento público e, dessa forma, não é avaliável. Proponho uma abordagem alternativa que torne pública as duas hipóteses-chaves que reforçam qualquer currículo: se envolvermos os alunos em experiências de aprendizagem específicas, eles vão adquirir certas competências; se eles adquirirem tais competências, serão capazes de alcançar resultados específicos a longo prazo, com consequências para eles e para as comunidades das quais fazem parte.

Esses recursos dão ao currículo uma visão pública, não partidária e que tem sido endossada por governos ao redor do mundo. Isso é o mais próximo que conseguimos chegar de um pacto público que reflita a aspiração compartilhada do “bem comum” da humanidade. Os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, incluídos na estrutura adotada por mais de 150 líderes mundiais na Assembleia Geral da ONU em 2015, oferecem uma visão otimista de um mundo que é inclusivo, pacífico e sustentável. Os objetivos conduzem uma série de metas específicas e mensuráveis. Por exemplo, o Objetivo 1 – Erradicação da Pobreza propõe a erradicação das formas mais extremas de pobreza no planeta e traz seis metas específicas:

 

1

Até 2030, reduzir pelo menos à metade a proporção de homens, mulheres e crianças, de todas as idades, que vivem na pobreza, em todas as suas dimensões, de acordo com as definições nacionais.

 

Implementar, em nível nacional, medidas e sistemas de proteção social adequados, para todos, incluindo pisos, e até 2030 atingir a cobertura substancial dos pobres e vulneráveis. 

 

3

Até 2030, garantir que todos os homens e mulheres, particularmente os pobres e vulneráveis, tenham direitos iguais aos recursos econômicos, bem como o acesso a serviços básicos, propriedade e controle sobre a terra e outras formas de propriedade, herança, recursos naturais, novas tecnologias apropriadas e serviços financeiros, incluindo microfinanças.

 

4

Até 2030, construir a resiliência dos pobres e daqueles em situação de vulnerabilidade, e reduzir a exposição e vulnerabilidade destes a eventos extremos relacionados com o clima e outros choques e desastres econômicos, sociais e ambientais.

 

5

Garantir uma mobilização significativa de recursos a partir de uma variedade de fontes, inclusive por meio do reforço da cooperação para o desenvolvimento, para proporcionar meios adequados e previsíveis para que os países em desenvolvimento, em particular os países menos desenvolvidos, implementem programas e políticas para acabar com a pobreza em todas as suas dimensões.

 

6

 

Criar marcos políticos sólidos em níveis nacional, regional e internacional, com base em estratégias de desenvolvimento a favor dos pobres e sensíveis a gênero, para apoiar investimentos acelerados nas ações de erradicação da pobreza.

Alcançar cada uma dessas metas requer ações específicas que, por sua vez, requerem capacidades específicas. Como essas metas globais só podem ser alcançadas se as comunidades locais fizerem a sua parte, elas necessariamente implicam em ações e escolhas feitas por muitas pessoas ao redor do mundo. Proporcionar às pessoas as capacidades para fazer escolhas e tomar atitudes é tarefa da educação.

Ao envolver os educadores na análise de quais competências são necessárias para alcançar as metas, e, por sua vez, discernir quais pedagogias e experiências ajudarão os alunos a adquiri-las, a abordagem que segui fez mais do que começar com o objetivo em mente. Ela proporcionou um nível de transparência e responsabilidade profissional e pública para as escolhas feitas em qualquer planejamento de currículo que raramente estão disponíveis em normas estatais ou com livros didáticos e recursos curriculares.

02 – Ativar redes de melhoria para projetar o currículo

O segundo princípio é que a tarefa de planejar o currículo, especialmente quando envolve domínios inovadores ou complexos, requer a colaboração de colegas. Embora possamos apreciar o ideal de que cada professor seja capaz de desenvolver o seu próprio currículo, na prática, o trabalho de ensinar é estruturado de tal forma que limita consideravelmente a quantidade de tempo dedicada ao planejamento do currículo. Não é surpresa que existem muitos recursos on-line para a ajudar o professor a compartilhar currículos e aulas e que, na prática, muitos docentes recorrem a recursos já existentes.

A razão pela qual os professores já criaram redes informais para compartilhar recursos, ou dependem de recursos existentes, é a complexidade do desenvolvimento curricular de alta qualidade. Tradicionalmente essa tem sido a vantagem das editoras de livros didáticos: a capacidade de envolver diversos editores especialistas, autores e outros profissionais, produzindo materiais de alta qualidade e distribuindo os custos necessários para financiar sua produção pelo grande número de usuários.

No entanto, existem limites para a forma convencional de alcançar economias de escala ao produzir materiais instrucionais, e um deles é que esses recursos devem ter como alvo algum grupo específico, razão pela qual muitos livros didáticos estão alinhados com as normas dos estados onde há mais alunos. Um dos méritos da ideia da Base Nacional Comum Curricular, um conjunto nacional de normas curriculares, é justamente o de capacitar tais economias de escala no desenvolvimento de recursos instrucionais de alta qualidade.

As redes profissionais têm uma nítida vantagem como forma de alavancar a inteligência coletiva. Elas podem se adaptar dinamicamente ao feedback decorrente dos ciclos rápidos da experimentação e podem aumentar o aprendizado decorrente de ciclos similares que ocorrem concomitantemente em diversos cenários. Nesse sentido, as redes profissionais têm um potencial inerente para aprendizagem e adaptação que foge das formas mais convencionais de produzir currículo e livros didáticos.

03 – Aprender fazendo

Os profissionais devem necessariamente experimentar como uma forma de criar novos conhecimentos. De fato, uma rede de desenvolvimento é um amplo laboratório para experimentações contínuas em busca de soluções para desafios complexos.

A epistemologia que reforça esse princípio é que o conhecimento profissional deve se valer da prática, não pode ser gerado na ausência de ou desprovido de prática. Ser professor é uma profissão não apenas porque aqueles que a praticam devem dominar o conhecimento especializado para conduzir seu trabalho, mas também no sentido de que aqueles que a praticam devem contribuir para o desenvolvimento de conhecimento especializado. Para tal conhecimento, baseado na prática, se tornar conhecimento profissional, disponível para outros, ele deve ser público, e não privado. Uma rede profissional é uma forma de fazer que o conhecimento oriundo da prática se submeta à análise essencial para se tornar público. Ademais, a confiança nos princípios de pensamento com base em planejamento e em redes de desenvolvimento proporciona um contexto para a experimentação sistemática e teste de hipóteses que estão implícitas em qualquer currículo.

04 – O poder de uma educação baseada em problemas

Algumas das competências necessárias para prosperar no século XXI são melhor adquiridas ao envolver os alunos em problemas reais e ao convidá-los a testarem soluções. Tal educação, baseada em problemas e projetos como esses, vale-se das tradições da educação progressiva desenvolvida por John Dewey e é consistente com o atual conhecimento sobre como defender um aprendizado mais profundo.

05 – O poder da colaboração em equipes diversas

A realização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável exigirá colaboração sem precedentes em todos os níveis. Se há uma habilidade que todos os alunos precisarão desenvolver é a colaboração. Os recursos apresentados nesses livros sobre metodologias baseadas em projetos ajudam a desenvolver tais habilidades colaborativas. Mas se os professores devem ensinar os alunos a colaborar, eles próprios devem aprender a co- laborar profissionalmente.

A prática da educação global e o movimento da educação global

Ao alinhar o currículo à estrutura dos Objetivos de Desenvolvimento das Nações Unidas, pretende-se cultivar uma mentalidade entre os alunos para educá-los como cidadãos globais.

O projeto de educar todos os alunos é um movimento global que começou com a disseminação do ensino público. Esse movimento de educação global acontecia de duas formas: envolvia colaborações entre a fraternidade de educadores de várias nações e ensinava os alunos a compreender o poder de tais colaborações globais para promoverem as suas próprias, bem como desafios compartilhados.

Não é por acaso que o ensino público expandiu significativamente ao redor do mundo após o direito à educação ser incluído como um dos direitos na Declaração Universal adotada pelas Nações Unidas em 1948. Foi o resultado da solidariedade global e da cooperação mobilizada para promover a paz mundial e da estabilidade que fez o ensino público expandir o seu alcance para incluir metade das crianças do mundo que foram excluídas antes da adoção da Declaração.

De forma semelhante, a expansão do ensino público antes da adoção da Declaração Universal dos Direitos Humanos beneficiou-se também da cooperação e das trocas entre as fronteiras nacionais.

Tais interesses e esforços sempre contestaram (e foram contestados por) visões mais paroquiais da educação. Atualmente, um nacionalismo e isolacionismo intolerante e ressurgente desafia as colaborações globais e a própria aspiração de educar alunos a serem cosmopolitas. Vemos tal ascensão do nacionalismo intolerante, ao qual o ex-vice-presidente norte-americano Joe Biden denominou “populismo falsificado e nacionalismo falso”, como um perigo ao princípio democrático básico, tal como à ideia de igualdade fundamental de todas as pessoas ou à ideia democrática de que os indivíduos devem colaborar com os outros para o bem comum. Esses desafios aos valores democráticos são exatamente a razão para envolver os alunos na educação global.

A educação global é sempre um caminho para desenvolver um conjunto mais amplo de competências necessárias para a participação em um mundo em constante mudança, que alguns denominaram “habilidades do século XXI” ou “aprendizado mais profundo” (Reimers e Chung 2016 e 2018). Como professores buscam novas formas de aprendizagem para preparar os alunos para as exigências do século XXI, descobrir pontos eficazes de entrada para a renovação pedagógica é fundamental. Mudanças são desafiadoras. As noções de que os alunos deveriam se envolver em problemas reais, ou de que eles deveriam fazer isso de forma colaborativa, por exemplo, embora raramente novas, já provaram ser bem difíceis de serem traduzidas para novas abordagens pedagógicas que foram dimensionadas para servir a todos os alunos. A educação global, largamente ausente em muitas escolas, proporciona um conveniente ponto de entrada para a renovação pedagógica, de uma forma que não ameaça diretamente culturas escolares estabelecidas, mas que pode, gradual e fundamental- mente, modernizar a instrução.

Uma nova liderança para o ensino público

As instituições de ensino público estão sob ataque das mesmas forças que atacam a democracia e os direitos humanos. Manter escolas públicas vai exigir a mesma liderança eficaz que a manutenção da democracia exige. Professores e suas organizações têm um importante papel para cumprir ao liderar um movimento amplo em apoio às escolas públicas.

Se for para mobilizar um movimento democrático de apoiadores de forma bem-sucedida, tal liderança deve se concentrar nas necessidades dos estudantes. Ou seja, tal liderança deve estar no centro da prática profissional do educador, e não apenas em questões básicas do dia a dia. Construir essa liderança vai exigir novas abordagens que deverão começar no ensino e no aprendizado. A rede profissional que desenvolvemos é uma forma de construir uma liderança profissional em que os professores se envolvem com o desafio de reinventar o currículo e a pedagogia a fim de servir aos alunos, para prepará-los para um mundo de constantes e rápidas mudanças.

Ao fazer esse trabalho, esses líderes dos professores estão desenvolvendo as habilidades necessárias para a colaboração e para a liderança colaborativa. Como o processo que esses professores seguiram incluía a aproximação de colegas em suas escolas, persuadindo-os a experimentar as novas aulas e recursos, essa experiência desenvolveu a liderança e cultivou habilidades necessárias para exercer influência sem autoridade, apoiando-se em conhecimento profissional e no comprometimento com um processo aberto e sujeito à responsabilidade profissional e pública.

Quase um século depois de Isaac Kandel defender a promoção do entendimento internacional nas escolas norte-americanas, para educar cidadãos globais que poderiam ser emissários da paz, as ameaças crescentes do populismo e da intolerância fazem isso tão necessário hoje em dia quanto era naquela época. Devemos renovar nossos esforços ao avançar na educação dos direitos humanos, na educação para a paz, na educação para a sustentabilidade e no desenvolvimento para a cidadania global, mesmo que esse trabalho se torne ainda mais difícil de fazer e os riscos de fazê-lo se tornem maiores.

Fernando M. Reimers

Especialista na área de políticas educacionais globais e inovação. É professor de Práticas Internacionais de Educação da Fundação Ford, diretor da Global Education Innovation Initiative e do Programa de Políticas de Educação Internacional da Harvard University.

Para saber mais:

  • REIMERS, Fernando M.; CHOPRA, Vidur; CHUNG, Connie K.; HIGDON, Julia; O’DONNEL, E.B. Empoderar Crianças e Jovens para a Cidadania Global. Download em mod.lk/ed15empo
  •  
  • REIMERS, Fernando M. Empoderando alunos para melhorar o mundo: um guia prático. Download em mod.lk/ed15guia
  •  
  • 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. Disponível em mod.lk/17objsus
  •  
  • Educação: um tesouro a descobrir (Unesco, 2010). Disponível em mod.lk/ed15ten1
  •  
  • Southern Poverty Law Center. Hate map. Disponível em mod.lk/hatemap

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ESPECIAL EDUCAÇÃO 4.0 | 01 Por onde começar?

ESPECIAL EDUCAÇÃO 4.0 | 01 Por onde começar?

O termo Educação 4.0 invadiu as pautas educacionais. Mas como a sua escola pode adentrar as portas do futuro que já chegou?

Revolução industrial e tecnológica, inteligência artificial, Internet das Coisas (IoT), linguagem computacional, robótica são termos ligados à Educação 4.0, que chegou para ficar! Antes de tudo, é importante entender que não existe um modelo pronto para aplicar e todos podem e devem contribuir, quebrando velhos paradigmas de uma educação descontextuali- zada, pautada em transmissão unilateral de conhecimento e ambientes pouco propícios ao processo de aprendizagem.

Com a recente aprovação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a tecnologia se tornou, de fato, uma competência de ensino, e deverá atravessar todo o currículo, permeando todas as áreas do conhecimento. Para muitos educadores e especialistas ligados ao tema, o modelo pautado na cultura maker — do faça você mesmo — é um dos caminhos.

Introduzir a escola nesse contexto torna-se cada dia mais essencial, principalmente porque o uso das tecnologias possibilita interação, colaboração e personalização do ensino. O seu uso, como estratégia, vem crescendo nas escolas, trazendo soluções inovadoras como o learning by doing, o aprender fazendo. 

O último Censo Escolar, realizado em 2017 pelo Instituto Nacional de Ensino e Pesquisa (INESP), disponível no site do QEdu, afirma que das 144.726 escolas da Educação Básica, apenas 40% (57.946 escolas) possuem laboratório de informática, 62% (90.027 escolas) possuem internet e 49% (71.145 escolas) possuem banda larga. Para acompanhar essa transformação na educação, a formação dos professores é primordial. As políticas públicas devem dar suporte, repensando o processo educacional e permitindo que criatividade e inventividade invadam as salas de aula.

Diante desse cenário, reunimos aqui algumas informações e conceitos que vêm sendo discutidos, para ajudar você a se preparar para o futuro que já chegou. 

 

Por onde começar?

A discussão sobre o tema está apenas começando e devemos enxergar aqui uma oportunidade de modificações no ensino, não somente com o uso de ferramentas virtuais, mas de ações inovadoras, por meio de novas abordagens educacionais que atendam ao perfil dos alunos que são nativos digitais.

O ponto de partida é a criação de ambientes propícios para o desenvolvimento de projetos que permitam aos estudantes vivenciar essa nova realidade. Espaços onde possam aprender fazendo e testando possibilidades, com metodologias ativas e com um processo de aprendizagem inovador. O movimento maker é a porta de entrada!

Por meio do pensamento maker, é possível criar uma cultura de inovação, invenção, programação e colaboração, trabalhando com metodologias ativas, transformando ferramentas em agentes de modificação, em que os alunos são ouvidos e se tornam parte vital do processo de aprendizagem.

No Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos, o grupo de trabalho Lifelong Kindergarten foi idealizado para pensar a educação pautada no brincar, a fim de explorar novos modelos, buscando soluções com uso de tecnologia e diversos materiais estruturados ou não.

O pesquisador do Media Lab do MIT, Leo Burd, defendeu no evento Hackathon Desafio 4.0, que ocorreu em Manaus, organizado pelo Instituto CERTI Amazonas, com apoio da Positivo Tecnologia, uma aprendizagem baseada no concreto, compartilhando trabalhos e experiências, respeitando o ambiente e promovendo a interação social. Para ele, permitir o erro é positivo no processo de aprendizagem. Esse modelo está sendo levado a escolas públicas brasileiras, por meio de uma rede brasileira de aprendizagem criativa, com intuito de promover trocas e encontros para formação docente. “Precisamos de gente inovadora que saiba usar os recursos que temos de forma criativa, consciente e colaborativa”, diz Burd.

 

Aprendizagem na educação 4.0 

Estamos vivendo um período de transformações, em que se faz necessário uma mudança de concepção da escola e na forma como os alunos aprendem, que passa a seguir novas abordagens e a exigir um currículo que valorize a experimentação e a vivência.

Colaborar, criar, pesquisar, compartilhar são ações do processo de cognição. Com a abertura do Ciberespaço, é uma tendência natural que o aluno tenha autonomia e busque conhecimento fora do ambiente escolar. O ensino híbrido permite trabalhar com modelos de rotações que mesclam di- versas estações de atividades, favorecendo a construção do conhecimento, tanto dentro quanto fora do ambiente escolar.

As salas de aulas passam a ter novas configurações no aspecto físico, favo- recendo a colaboração e a interação entre os estudantes. Além disso, o de- senvolvimento de habilidades e competências que valorizam a pesquisa e a troca de experiências colaborativas será a base da cognição, tornando o processo significativo e envolvente para os alunos. 

Métodos de aprendizagem baseados em projetos “mão na massa”, como STEAM (Science, Technnology, Engi- neering, Arts e Mathematics) e Design Thinking, possibilitam reflexão, inter- disciplinaridade e motivação para pro- mover ações diferenciadas, convidando os alunos a explorar resoluções de problemas pensadas a partir de questões sociais, interesses próprios e realidade escolar, propondo novas soluções para investigar, descobrir, conectar, refletir, intervir, sensibilizar a partir dos resultados, testando possibilidades, dentro de um processo contínuo. 

Os estudantes passam a ser o centro do processo de aprendizagem, em que o erro terá um espaço fundamental na metodologia. Ao testar possibilidades, ele terá a oportunidade de analisar sua trajetória e intervir sobre ela, aprendendo de maneiras e formas diferentes, em processos que privilegiam a cognição e não o produto, desenvolvendo habilidades e competências:

 

Com a internet, cada dia mais acessível, móvel e presente no cotidiano, os estudantes têm acesso a múltiplos conhecimentos a um clique e buscam referências sobre tudo o que quiserem. Tais mudanças têm refletido na atuação das escolas, que passam a valorizar a criação de situações de pertencimento em que os alunos tenham voz e autonomia para participar ativamente da construção do aprendizado. — De acordo com a Lei 9.610/98 é proibida a reprodução total ou parcial desta website, em qualquer meio de comunicação, sem prévia autorização.

Habilidades do professor 

São inúmeros os benefícios de uma educação pautada no aprender fa- zendo. Esta permite a aplicação de um currículo mais interessante e in- terdisciplinar, a realização de atividades de investigação, o fazer com as mãos e o compartilhar, focando em um modelo de ensino que leve em consideração a evolução do conhecimento, com qualidade e equidade. 

O desafio é grande, devido à infraestrutura e à conectividade de muitas escolas, porém, como contraponto, vemos as narrativas digitais incorporadas à rotina escolar, em que educadores são e serão cada vez mais essenciais, sendo motivadores para o uso de novas possibilidades de atividades, projetos e interação na sala de aula, fomentando autonomia, criticidade e protagonismo.

O professor deve ter o olhar para essa revolução, estimulando múltiplas redes de aprendizagem, permitindo uma gama de associações e de significações entre a escola e a comunidade do entorno. 

A participação efetiva de todos os atores é fundamental para que a prática educativa seja revitalizada, permitindo interação e ampliação desse ambiente de aprendizagem que contribui diretamente para o desenvolvimento intelectual e pessoal do aluno. O docente deve refletir sobre as diferentes práticas adotadas para garantir que o aluno seja o eixo central do processo de aprendizagem.

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Revolução industrial e tecnológica, inteligência artificial, Internet das Coisas (IoT), linguagem computacional, robótica são termos ligados à Educação 4.0, que chegou para ficar! Antes de tudo, é importante entender que não existe um modelo pronto para aplicar e todos podem e devem contribuir, quebrando velhos paradigmas de uma educação descontextuali- zada, pautada em transmissão unilateral de conhecimento e ambientes pouco propícios ao processo de aprendizagem.

Com a recente aprovação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), a tecnologia se tornou, de fato, uma competência de ensino, e deverá atravessar todo o currículo, permeando todas as áreas do conhecimento. Para muitos educadores e especialistas ligados ao tema, o modelo pautado na cultura maker — do faça você mesmo — é um dos caminhos.

Introduzir a escola nesse contexto torna-se cada dia mais essencial, principalmente porque o uso das tecnologias possibilita interação, colaboração e personalização do ensino. O seu uso, como estratégia, vem crescendo nas escolas, trazendo soluções inovadoras como o learning by doing, o aprender fazendo. 

O último Censo Escolar, realizado em 2017 pelo Instituto Nacional de Ensino e Pesquisa (INESP), disponível no site do QEdu, afirma que das 144.726 escolas da Educação Básica, apenas 40% (57.946 escolas) possuem laboratório de informática, 62% (90.027 escolas) possuem internet e 49% (71.145 escolas) possuem banda larga. Para acompanhar essa transformação na educação, a formação dos professores é primordial. As políticas públicas devem dar suporte, repensando o processo educacional e permitindo que criatividade e inventividade invadam as salas de aula.

Diante desse cenário, reunimos aqui algumas informações e conceitos que vêm sendo discutidos, para ajudar você a se preparar para o futuro que já chegou. 

 

Por onde começar?

A discussão sobre o tema está apenas começando e devemos enxergar aqui uma oportunidade de modificações no ensino, não somente com o uso de ferramentas virtuais, mas de ações inovadoras, por meio de novas abordagens educacionais que atendam ao perfil dos alunos que são nativos digitais.

O ponto de partida é a criação de ambientes propícios para o desenvolvimento de projetos que permitam aos estudantes vivenciar essa nova realidade. Espaços onde possam aprender fazendo e testando possibilidades, com metodologias ativas e com um processo de aprendizagem inovador. O movimento maker é a porta de entrada!

Por meio do pensamento maker, é possível criar uma cultura de inovação, invenção, programação e colaboração, trabalhando com metodologias ativas, transformando ferramentas em agentes de modificação, em que os alunos são ouvidos e se tornam parte vital do processo de aprendizagem.

No Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos, o grupo de trabalho Lifelong Kindergarten foi idealizado para pensar a educação pautada no brincar, a fim de explorar novos modelos, buscando soluções com uso de tecnologia e diversos materiais estruturados ou não.

O pesquisador do Media Lab do MIT, Leo Burd, defendeu no evento Hackathon Desafio 4.0, que ocorreu em Manaus, organizado pelo Instituto CERTI Amazonas, com apoio da Positivo Tecnologia, uma aprendizagem baseada no concreto, compartilhando trabalhos e experiências, respeitando o ambiente e promovendo a interação social. Para ele, permitir o erro é positivo no processo de aprendizagem. Esse modelo está sendo levado a escolas públicas brasileiras, por meio de uma rede brasileira de aprendizagem criativa, com intuito de promover trocas e encontros para formação docente. “Precisamos de gente inovadora que saiba usar os recursos que temos de forma criativa, consciente e colaborativa”, diz Burd.

 

Aprendizagem na educação 4.0 

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Colaborar, criar, pesquisar, compartilhar são ações do processo de cognição. Com a abertura do Ciberespaço, é uma tendência natural que o aluno tenha autonomia e busque conhecimento fora do ambiente escolar. O ensino híbrido permite trabalhar com modelos de rotações que mesclam di- versas estações de atividades, favorecendo a construção do conhecimento, tanto dentro quanto fora do ambiente escolar.

As salas de aulas passam a ter novas configurações no aspecto físico, favo- recendo a colaboração e a interação entre os estudantes. Além disso, o de- senvolvimento de habilidades e competências que valorizam a pesquisa e a troca de experiências colaborativas será a base da cognição, tornando o processo significativo e envolvente para os alunos. 

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Os estudantes passam a ser o centro do processo de aprendizagem, em que o erro terá um espaço fundamental na metodologia. Ao testar possibilidades, ele terá a oportunidade de analisar sua trajetória e intervir sobre ela, aprendendo de maneiras e formas diferentes, em processos que privilegiam a cognição e não o produto, desenvolvendo habilidades e competências:

 

Com a internet, cada dia mais acessível, móvel e presente no cotidiano, os estudantes têm acesso a múltiplos conhecimentos a um clique e buscam referências sobre tudo o que quiserem. Tais mudanças têm refletido na atuação das escolas, que passam a valorizar a criação de situações de pertencimento em que os alunos tenham voz e autonomia para participar ativamente da construção do aprendizado. — De acordo com a Lei 9.610/98 é proibida a reprodução total ou parcial desta website, em qualquer meio de comunicação, sem prévia autorização.

Habilidades do professor 

São inúmeros os benefícios de uma educação pautada no aprender fa- zendo. Esta permite a aplicação de um currículo mais interessante e in- terdisciplinar, a realização de atividades de investigação, o fazer com as mãos e o compartilhar, focando em um modelo de ensino que leve em consideração a evolução do conhecimento, com qualidade e equidade. 

O desafio é grande, devido à infraestrutura e à conectividade de muitas escolas, porém, como contraponto, vemos as narrativas digitais incorporadas à rotina escolar, em que educadores são e serão cada vez mais essenciais, sendo motivadores para o uso de novas possibilidades de atividades, projetos e interação na sala de aula, fomentando autonomia, criticidade e protagonismo.

O professor deve ter o olhar para essa revolução, estimulando múltiplas redes de aprendizagem, permitindo uma gama de associações e de significações entre a escola e a comunidade do entorno. 

A participação efetiva de todos os atores é fundamental para que a prática educativa seja revitalizada, permitindo interação e ampliação desse ambiente de aprendizagem que contribui diretamente para o desenvolvimento intelectual e pessoal do aluno. O docente deve refletir sobre as diferentes práticas adotadas para garantir que o aluno seja o eixo central do processo de aprendizagem.

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Especial Metodologias ativas | Aplicando estratégias na prática

Especial Metodologias ativas | Aplicando estratégias na prática

Como aplicar estratégias que tornem os alunos parceiros na construção de aulas mais atrativas? 

 
 
O professor tenta exaustivamente explicar o conteúdo seguidas vezes, muda o ponto de vista, muda o esquema exposto na lousa, exemplifica de duas, três, quatro formas diferentes. A cada pausa, chama a atenção de diferentes grupos de alunos, que insistem em não prestar atenção. Alguns conversam, alguns mexem nos seus celulares, outros fazem tarefa de outra disciplina, outros ainda simplesmente permanecem com o olhar vazio de quem faz força para manter os olhos abertos no início da manhã. Já transpirando e quase rouco de tanto aumentar o tom de voz, o professor chama a atenção de um aluno que ri alto, distraído com alguma piada contada no fundo da classe.
 
“– Fica de boa, profe. Depois eu vejo isso aí no YouTube.” A cena em questão é real e aconteceu comigo, mas com certeza se repetiu muitas vezes e ainda se repete em diversas salas de aula ao redor do mundo. No meu caso, foi um divisor de águas para minha prática docente. Depois de quase espumar de raiva diante da insolência, do desrespeito, parei e pensei: ele tem razão. — De acordo com a Lei 9.610/98 é proibida a reprodução total ou parcial desta website, em qualquer meio de comunicação, sem prévia autorização.
 
O professor e palestrante indiano Sugata Mitra, em sua apresentação na Campus Party de 2012, afirmou categoricamente que um professor que possa ser substituído por uma máquina deve ser substituído. E, tirando todo o mal-estar que essa declaração pode nos causar, fica muito mais fácil entender o ponto de vista do meu aluno quanto ao que eu estava fazendo naquele momento. O que a minha aula oferece que a faz ser melhor que as videoaulas superenvolventes ao alcance das mãos dos meus alunos? Meu aluno consegue controlar o professor do vídeo ao toque do seu dedo. Ele pausa, volta, explica de novo. O professor do vídeo não fica bravo se o aluno dorme no meio da explicação, nem se ele resolve trocar a aula por um joguinho para continuar depois, nem se ele não anota ou não faz o exercício. E o professor do vídeo não impede o aluno de comentar com os colegas o último episódio de Game of Thrones. Mas então, como competir com o professor do vídeo? A resposta é muito simples: oferecendo ao aluno uma experiência com a qual o professor do vídeo não consegue competir.
 

Inversão da sala de aula com um tempero a mais 

A ideia de inversão de sala de aula não é nada nova, mas ganhou fôlego novo com a nova geração de EduTubers. Toda aquela explicação maçante e que não depende de interação, exatamente aquela parte da aula que meu aluno preferiu assistir no YouTube, pode ser passada como lição de casa. E a lição de casa tradicional – os exercícios – nós trazemos para a sala de aula. Dificilmente você nunca ouvir falar disso, mas como tornar essa experiência verdadeiramente enriquecedora para os seus alunos? 

 

01 – A escolha do vídeo de preparo prévio 

#CAPACIDADEDEPESQUISA #RACIOCÍNIOCRÍTICO #CIDADANIADIGITAL

A internet tem muita informação, mas isso não significa que essa informação toda tem qualidade. A escritora Martha Gabriel compara a nossa prática de buscar respostas na internet com a prática dos gregos de buscar respostas em oráculos. A resposta pode até estar lá, mas quase nunca será direta, objetiva e perfeitamente confiável. O seu aluno vai buscar essas respostas com ou sem a sua ajuda. Então, o melhor que podemos fazer como educadores é ajudar nesse caminho.
 
A solução mais óbvia para o professor seria assumir a pesquisa e curadoria do material. O próprio YouTube nos ajuda nesse sentido com o YouTube EDU (youtube.com/edu), que é um portal que reúne conteúdo de uma infinidade de criadores e que passam por uma curadoria refinada de acadêmicos das mais diversas áreas numa parceria do Google com a Fundação Lemann. Mas, se a ideia é justamente centrar o processo de aprendizado no nosso aluno, por que não permitir que ele se responsabilize por isso também?
 
E se, ao invés de investir meu tempo em pesquisar os melhores vídeos de um determinado conteúdo, eu dividisse os alunos em grupos e destinasse a cada um desses grupos a responsabilidade pelo material de referência para a turma? Eles podem fazer a pesquisa ou mesmo produzir os próprios vídeos. Pode aparecer algum vídeo ruim, com falhas conceituais? Pode, claro. Mas a principal característica de um professor disposto a inovar em suas práticas é a compreensão de que o erro não é algo a ser evitado, mas sim uma valiosa oportunidade de aprendizado. Discuta o erro, construa junto com seus alunos uma discussão a partir da qual todos entendam os princípios do conceito e quais as falhas identificadas no material.
 
Mas como verificar se os alunos se prepararam ou não? Podemos pedir resumos no caderno ou perguntar oralmente, mas tenha em mente que a melhor estratégia será sempre reforçar positivamente os estudantes que se prepararam. Esse é um processo contínuo, ou seja, não vai acontecer do dia para a noite. Sempre que possível destaque os alunos preparados durante a aula para que os outros entendam que eles estão perdendo mais do que nota quando não se preparam.
 

Uma possibilidade interessante é apresentada pelas perguntas abertas no Google Classroom. Podemos criar uma pergunta em que os alunos enxergam as respostas uns dos outros e podem inclusive comentar o trabalho dos colegas. Lembre-se de que não precisa estar certo. Nessa fase do processo, muito mais desejado que um trabalho perfeito é um trabalho feito.

 

02 – Trabalho em pares 

#EMPATIA #FIXAÇÃODECONTEÚDOS  

A explicação foi transferida para a lição de casa. O aluno vai assistir a um vídeo e fazer um resumo ou responder uma pergunta. Em determinados pontos do seu planejamento, ele vai inclusive ser responsável pelo preparo prévio da turma inteira. Chegou a hora de pensar em como será a experiência na sala de aula. O que a sua sala de aula tem que o professor do YouTube não tem? O celular tem touch screen, mas a sala tem touch skin.

A sala tem outros estudantes ao vivo, tem contato, colaboração. E se o que seu aluno quer é interagir com os colegas, forneça para ele uma experiência que propicie essa interação de modo a construir conhecimento.

Um diagrama muito ilustrativo sobre a forma como retemos os conteúdos acadêmicos, embora falsamente atribuído a William Glasser, é a Pirâmide de Aprendizagem. Enquanto o topo da pirâmide nos aponta uma aprendizagem pífia, quando apenas lemos, a base nos apresenta um aprendizado muito mais amplo quando ensinamos aos outros. — De acordo com a Lei 9.610/98 é proibida a reprodução total ou parcial desta website, em qualquer meio de comunicação, sem prévia autorização.

Algo que eu aprendi na prática, muito antes de conhecer a Pirâmide de Aprendizagem, é que quando juntamos dois alunos com níveis muito diferentes de compreensão de um determinado assunto e um explica para o outro, quem mais ganha com a experiência é quem explica. O ato de refletir sobre o que se está aprendendo, estruturar as ideias e elaborar um jeito de passar para o colega faz com que o explicador adquira inevitavelmente uma compreensão superior do conceito em questão.

Quando o aluno assiste a uma palestra dentro da sala de aula para tentar fazer os exercícios em casa, qualquer fragilidade na compreensão dos conceitos apresentados em sala se transformará numa barreira intransponível quando se encontrar sozinho diante desse desafio. Trazer para a sala esse momento e contar com a interação entre pares para o desenvolvimento da prática dos conceitos apresentados traz para perto do professor as dúvidas e humaniza o processo, algo que a princípio é uma ideia contraintuitiva quando falamos do uso de vídeos educacionais. 

03 – Avaliação compartilhada

#METACOGNIÇÃO #RESPONSABILIZAÇÃOCOLETIVAPELOPROCESSO 

Quando falamos de avaliação, pensamos quase que imediatamente em provas. Uma prova avalia de maneira questionável o conhecimento adquirido pelo aluno, normalmente ao final do um processo. E quanto à avaliação entre pares? E se os alunos pudessem também avaliar o seu trabalho ou mesmo a experiência como um todo? O consultor educacional Cadu Braga diz em suas palestras que temos todos os dias os melhores consultores educacionais disponíveis em nossas salas de aula, sentados à nossa frente. Então, não faz sentido que desperdicemos essa expertise ignorando o que ela pode nos oferecer.

No início do processo, podemos pedir para que os alunos, por exemplo, avaliem o quanto o material do preparo os ajudou a compreender o conceito apresentado. Mais tarde, nos exercícios em duplas ou grupos, podemos pedir que os alunos avaliem seus colegas. E, ao final, que autoavaliem seu envolvimento e seu domínio do conteúdo. Não faz sentido resumir essas perguntas apenas a notas e, se houver a oportunidade, cabe discutir com eles inclusive quais são as perguntas que definem melhor o que vocês querem saber. Ferramentas digitais como o Formulários Google ou o Survey Monkey podem ajudar, mas uma caixa de coleta de avaliações escritas em papel já resolve a questão. Qualquer que seja o suporte de sua avaliação, discutir os critérios e resultados são momentos cruciais, já que o motivo central de todo esse esforço está justamente em fazer com que o aluno reflita sobre a experiência de aprendizado oferecida e, ainda mais importante, o seu processo individual de aprendizado. 

 

Não planeje aulas 

Antes de começar a pensar nos conteúdos, nos vídeos ou nas tarefas, é preciso fazer uma reflexão profunda sobre nosso papel como professores. O que significa ser um bom professor? Assim como as comédias românticas, em geral, distorcem nossas expectativas sobre o que esperar de um relacionamento, as cenas de sala de aula do cinema nos fazem sonhar com alunos vidrados e admirados com nossos discursos eloquentes, sempre finalizados com salvas de palmas. Mas ser um bom professor é, acima de tudo, promover experiências de aprendizado eficazes para seus alunos. E, se é esse o objetivo, não faz sentido que nosso planejamento esteja focado nos conteúdos, nos exercícios que serão realizados ou na prova que os alunos terão de fazer no final do bimestre. Essas coisas todas são importantes, mas não são fins: são meios.
 
Precisamos fazer nosso planejamento do ponto de vista do aluno. Não dos conteúdos, mas da experiência que fornecemos. O que esse aluno fará no tempo que passará com você?
 

Esteja pronto para a resistência

Se você já iniciou suas incursões em meio à inovação no ensino, com certeza, já se deparou com resistências. Mas talvez a resistência mais doída para o professor é a dos alunos, e você tem que estar preparado para ela. O princípio mais básico das metodologias ativas é que os alunos devem estar fazendo algo, não apenas passivos diante de explicações e exemplificações. Mas trabalhar, de fato, dá trabalho. Ponha-se no lugar de seus alunos: você também reclamaria se de repente lhe fizessem trabalhar mais apenas confiando que isso é o melhor para você.
 

Compartilhe, compartilhe, compartilhe!  

Por fim, precisamos entender que acabou o tempo de trabalhar sozinho. Tente sempre que possível fazer com que o produto do seu trabalho e também o de seus alunos seja algo passível de ser compartilhado. Quando um aluno sabe que seu trabalho será compartilhado com o resto da sua turma ele quase que magicamente passa a se importar mais com o resultado. E, de forma semelhante, quando você compartilha seu trabalho com colegas, quase que magicamente sua coragem é multiplicada. 
 
Tiago Bevilaqua
É professor desde 2006 com experiências desde o Ensino Fundamental 2 até o pré-vestibular. É consultor em Tecnologia Educacional pela RedeXplica e possui certificação Google Certified Teacher e Google Innovator.
 
Para saber mais
  • Sugata Mitra na Campus Party 2012 youtu.be/BBzDOS5UrG0
  • Martha Gabriel com Marcelo Tas: A Era da Busca: oráculos digitais youtu.be/n150AZ0Jetg
  • Ted Talks – Let’s use video to reinvent education, Salman Khan youtu.be/nTFEUsudhfs
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Por – Tiago Bevilaqua

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Especial Metodologias ativas | O fim do aluno nota 10

Especial Metodologias ativas | O fim do aluno nota 10

Novos modelos de avaliação em projetos com metodologias ativas 

Novas profissões estão emergindo dia após dia com as transformações da sociedade e o avanço das tecnologias. Como a escola pode colaborar para a formação de alunos capazes de desenvolver habilidades e competências durante toda a vida?

A urgente necessidade de realizar profundas transformações nas metodologias de ensino para promover oportunidades de aprendizagem significativa que permitam desenvolver as competências para o século XXI traz o desafio inexorável de reveros ultrapassados processos de avaliação dos alunos, que ainda são julgados muito mais pelo conhecimento teórico adquirido nos bancos escolares do que por suas habilidades socioemocionais e a capacidade de aplicar seus saberes na prática.

Nos próximos 10 ou 15 anos, quando nossas crianças e jovens estarão ingressando no mercado de trabalho, o mundo corporativo será completamente diferente do que conhecemos até hoje como fruto da revolução industrial. A economia criativa irá demandar (e já está valorizando) profissionais que sejam inovadores, visionários e, acima de tudo, empreendedores; sempre prontos a enfrentar desafios e solucionar problemas.

Se nas últimas décadas o sucesso na carreira esteve atrelado à capacidade de aprender uma profissão em determinada área (humanas, exatas ou biológicas), as novas gerações precisarão, cada vez mais, aprender a aprender, ou seja, terão que ser multicomponentes e estudar por toda vida.

A automação de funções repetitivas com o avanço da inteligência artificial levará ao desaparecimento de profissões milenares, que serão assumidas por robôs, e ao surgimento de profissões do futuro que sequer somos capazes de imaginar, fazendo com que os momentos de aprendizagem sejam permanentes e por toda a vida.

Para ser competitivo, o profissional deste novo mundo precisará acompanhar continuamente a próxima invenção, a próxima tendência, o próximo mercado a eclodir. Está saindo de cena o profissional tecnicista e subindo ao palco o profissional criativo, aberto ao risco e à inovação, capaz de pensar o tempo todo ‘fora da caixa’.

Para ser competitivo, o profissional deste novo mundo precisará acompanhar continuamente a próxima invenção, a próxima tendência, o próximo mercado a eclodir. Está saindo de cena o profissional tecnicista e subindo ao palco o profissional criativo, aberto ao risco e à inovação, capaz de pensar o tempo todo ‘fora da caixa’.

Será que as políticas pedagógicas atuais estão alinhadas aos desafios desta nova sociedade digital, conectada, veloz e sedenta por enterrar antigos modelos corporativos para dar lugar a empresas com gestão horizontal, estruturas organizacionais flexíveis e, acreditem, dispostas a reconhecer o erro como combustível para a inovação?

Caros educadores, cabe a reflexão

Os modelos pedagógicos de nossas escolas ainda são muito mais direcionados ao ensino teórico para passar no funil do vestibular, obrigando os alunos a decorar fórmulas matemáticas, afluentes de rios ou a morfologia dos insetos para ter depois seus conhecimentos testados e avaliados por notas que não diferenciam as vocações ou interesses individuais.

É uma avaliação cruel, que prioriza a inteligência da decoreba ao invés da inteligência criativa.

Se quisermos realmente formar nossos alunos para a economia do século XXI, movida pelas novas tecnologias e a revolução nas relações de trabalho, precisaremos dar espaço a uma cultura maker, ao ‘fazer para aprender’, desenvolvendo e implementando metodologias ativas de ensino que tirem os alunos da zona de conforto da sala de aula e os desafie a desenvolver projetos multidisciplinares, capazes de causar impacto real e efetivo na comunidade em que vivem e, assim, trazerem significado ao aprendizado.

Faça uma experiência. Dê um brinquedo novo para uma criança e observe sua reação. Ela vai brincar, desmontar, remontar e investigar o brinquedo, não é mesmo? Este impulso de querer desvendar o desconhecido, descobrir o mundo, perguntar os porquês de tudo é próprio da natureza das crianças. Elas têm um potencial criativo pronto a ser estimulado. Mas, ao invés de priorizar um aprendizado prático, a escola como está estruturada hoje, apresenta uma tonelada de teorias que terão pouca aplicação na vida pessoal ou profissional do aluno. Sem motivação, os jovens entram em um looping de conteúdos pensados para atender uma geração que buscava ter ‘empregabilidade’, mas que agora precisará ter ‘trabalhabilidade’.

Os profissionais que começarão suas carreiras nas próximas décadas não passarão longos anos no mesmo emprego. Ao invés disso, precisarão reunir competências para trabalhar em diferentes projetos que tragam reconhecimento e realização, que sejam éticos e sustentáveis, que ajudem a mudar o mundo para melhor.

Neste futuro, o fim das salas de aula como conhecemos, com um professor trabalhando o mesmo conteúdo com as mesmas estratégias para todos os alunos, será inevitável. Ao adotarem novos formatos de ensino e inserirem novas tecnologias como ferramentas pedagógicas, as escolas também irão rever seus processos de avaliação.

Outros critérios deverão ser incorporados. Mais do que simplesmente ser avaliado se estudou para a prova (e esquecer tudo assim que entregá-la ao professor), o aluno será testado por sua força criativa e inovadora, sua capacidade de liderança, de resolver problemas e trabalhar em equipe, de se relacionar, de ter autonomia e proatividade, de aprender com os erros e dominar o uso das novas tecnologias, entre outros parâmetros.

Nesta nova escola, a avaliação deixa de ter um papel de julgar e expor o nível de conhecimento de um aluno para ser vista como a valorização e a validação do aprendizado. Não caberá mais exaltar o aluno que tirou boa nota e crucificar o aluno que foi mal na prova. A avaliação deve ser não o fim, mas uma parte intrínseca ao processo de construção do conhecimento.

Na economia criativa e na cultura da inovação o erro é reconhecido como a melhor forma de aprender. E, da mesma forma, a escola precisa incorporar o feedback contínuo ao aluno com critérios muito além dos técnicos avaliados na prova bimestral e na prova final. O professor passa a ser um mediador do aprendizado, fazendo um diagnóstico mais amplo das habilidades e conhecimentos do aluno. Não basta saber; é preciso fazer.

Em processos que envolvem metodologias ativas, tais como aprendizagem baseada em projetos, três fatores são essenciais para alcançar resultados significativos: a curiosidade, o interesse pela pesquisa e ter uma postura cooperativa. O conteúdo não deve seguir a velha cartilha. O caminho para o aprendizado significativo está em incentivar o aluno a ser questionador, a buscar respostas para problemas identificados por ele mesmo e a atuar como um time com seus colegas.

Com fácil acesso a um oceano infinito de conteúdos disponíveis na nuvem e tendo à disposição ferramentas tecnológicas que propiciam a interação e participação ativa, estudar deixa de seguir um roteiro unidirecional (professor – livros – aluno) para ser impulsionado por um aprendizado colaborativo pautado pelo desejo de aprender, refletir, perguntar, analisar, confrontar, revisitar e descobrir.

A adoção de modelos pedagógicos ativos para que o aluno vivencie na prática o dia a dia profissional e aprenda a enfrentar desafios, trabalhar em equipe e sob pressão, administrar o tempo e fazer sua autoavaliação, entre outras competências, torna a avaliação muito mais complexa do que simplesmente checar o gabarito. Exige, de fato, uma visão mais holística sobre o aluno.

No Instituto Crescer desenvolvemos, por exemplo, a metodologia ativa Tecendo Redes que segue o pressuposto teórico da pedagogia construtivista para implementação de projetos de aprendizagem. Neste modelo, o aluno parte da curiosidade e das indagações para iniciar um processo investigativo de problemas reais que atingem sua vida e, com a mediação do professor (e não como única fonte de conhecimento), conquistar maior autonomia nos seus estudos. Ao término do projeto, o estudante compartilha o que aprendeu com a comunidade escolar ou outras pessoas pela internet.

Nesta metodologia, analisamos critérios que serão levados em conta quando os alunos de hoje chegarem ao mercado de trabalho. Processo similar pode ser organizado para avaliar outras metodologias ativas implementadas em processos de ensino e aprendizagem na sua escola. Relaciono abaixo 10 passos que podem ser úteis na transformação do processo de avaliação formativa de seus alunos, fazendo com que ela seja parte integrante de um processo de aprendizagem significativa e esteja alinhada com o desenvolvimento de competências para o século XXI:

01 – Compartilhe o processo avaliativo deixando claro para os alunos o que será analisado antes de dar início ao processo.

02- Organize uma rubrica com critérios qualitativos e quantitativos de avaliação, como: organização, interação e trabalho da equipe, qualidade da pesquisa e da apresentação do projeto, administração do tempo, clareza na apresentação oral, complexidade no uso de tecnologias digitais, inovação e criatividade.

03 – Conhecimentos prévios. No início do projeto, peça aos alunos que registrem o que já sabem sobre o tema e o que mais gostariam de saber.

04 – Dedique um tempo para uma autoavaliação. No final do projeto, com a rubrica em mãos, os alunos deverão analisar seus pontos fortes e o que devem melhorar para futuros projetos.

05 – Organize uma roda de conversa e faça perguntas esclarecedoras. Auxilie no entendimento do contexto e de como o processo foi vivenciado pela equipe. Quem participou? Quanto tempo levou para definirem o tema? Como se organizaram?Quais ferramentas tecnológicas utilizaram?

06 – Utilize paráfrases que ajudem a equipe a confirmar o entendimento sobre a avaliação que fizeram: quer dizer que…?, pelo que entendi…?, foi isso mesmo? — De acordo com a Lei 9.610/98 é proibida a reprodução total ou parcial desta website, em qualquer meio de comunicação, sem prévia autorização.

07 – Faça perguntas de sondagem que levem os alunos a tirar suas próprias conclusões sobre o que vivenciaram. O que poderia ser feito para administrar melhor o tempo? Como vocês poderiam utilizar melhor os recursos tecnológicos?

08 – Repasse o resultado da avaliação com cada equipe. Encerre a roda de conversa olhando os resultados apresentados na rubrica e confirmando entendimento. 

09 – Estimule a autoavaliação dos integrantes da equipe. O que você leva deste projeto? O que você já sabia? O que foi desafiador? O que gostaria de sugerir ao professor e para equipe?.

10 – Compare os conhecimentos. Peça às equipes uma lista comparativa dos conhecimentos adquiridos após o processo de pesquisa com os conhecimentos prévios. — De acordo com a Lei 9.610/98 é proibida a reprodução total ou parcial desta website, em qualquer meio de comunicação, sem prévia autorização.

A estratégia apresentada acima para promover a avaliação em processos de metodologias ativas ajuda a verificar o avanço dos alunos em relação ao desenvolvimento de suas competências para o século XXI. Dentre elas, podemos mencionar a busca de informações na internet, a leitura e produção de diferentes tipos de texto, o uso de tecnologias digitais, o trabalho em equipe, a administração do tempo, a autoavaliação, etc.

Já para avaliar os resultados de aprendizagem referente ao currículo, sugerimos que os alunos dediquem um tempo para registrar, individualmente, o que agora sabem sobre o tema investigado. O resultado deverá ser comparado aos conhecimentos que eles tinham sobre o tema no início do projeto, quando fizeram uma lista do que já sabiam e suas principais curiosidades. Provavelmente, você se surpreenderá ao ver o quanto eles avançaram e confirmará a efetividade do trabalho com metodologias ativas, não só para desenvolver competências, foco da educação contemporânea, mas também para aprender coisas novas. Traços de felicidade, satisfação, engajamento, iniciativa e criatividade serão constantes, o que se configura em momentos reais de aprendizagem significativa que ficam marcados para toda a vida. Crie coragem! Ouse e experimente esta nova dinâmica nas suas próximas aulas! 

Luciana Allan 

Diretora do Instituto Crescer e Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo (USP) com especialização em tecnologias digitais aplicadas à educação.

Para saber mais

Instituto Crescer www.institutocrescer.org.br 

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